UnB - Instituto de Geociências - Contribuições Científicas
RESUMOS EXPANDIDOS / EXPANDED ABSTRACTS 


ESTUDO ISOTÓPICO DA CARBONATAÇÃO ASSOCIADA AO DEPÓSITO AURÍFERO OGÓ, GREENSTONE BELT PILAR DE GOIÁS, GOIÁS 

Gênova Maria Pulz 1
Reinhardt Adolfo Fuck2

1 Instituto De Geociências, Ufrgs, Porto Alegre
2 Instituto De Geociências, Unb, Brasilia

V Congresso Brasileiro de Geoquímica e III Congresso de Geoquímica dos países de Língua Portuguesa, Niterói/RJ, 1995. Resumos expandidos - publicado em CDROM.

Introdução

O depósito Ogó situado nas imediações de Pilar de Goiás (Goiás), é uma das mais importantes ocorrências de ouro conhecidas no greenstone belt  Pilar de Goiás. As paragêneses e texturas dos minerais de minério apresentam uma evolução em multi-estágios, envolvendo a deposição exalativa, o metamorfismo e a remobilização do minério. A complexidade genética desse depósito estimulou a aplicação dos isótopos estáveis em carbonatos, visando elucidar a origem das soluções hidrotermais.

A assinatura isotópica dos carbonatos que ocorrem nos veios auríferos, nos exalitos (metacherts, turmalinitos) e nas rochas calcissilicáticas adjacentes ao depósito Ogó foi determinada no CENA (USP). O procedimento analítico utilizado foi o de McCrea (1950). Os dados foram complementados com análises dos filitos carbonosos que ocorrem na camada mineralizada. Os resultados de d13C foram padronizados pelo PDB (Peedee Belemnite), enquanto os valores de d18O foram normalizados pelo SMOW (Standard Mean Ocean Water).

Contexto geológico

O depósito Ogó situa-se no topo do Grupo Pilar de Goiás, compreendendo um espesso pacote de metapelitos, filitos carbonosos, exalitos e rochas vulcanoclásticas que sustentam a Serra do Moinho. Intercaladas nos metassedimentos e exalitos ocorrem delgadas camadas de clorita xistos, provavelmente derivadas de metabasaltos. Na base dos metassedimentos afloram rochas ultrabásicas representadas por carbonato-talco xistos e tremolita-talco xistos com carbonato, os quais se sobrepõem à unidade de rochas calcissilicáticas.

O metamorfismo da área atingiu condições do fácies xisto verde alto a anfibolito como exemplicam as paragêneses das rochas ultrabásicas (talco, clorita e tremolita) e dos metapelitos (clorita, mica branca, quartzo, hornblenda, biotita, granada e estaurolita). Localmente, o metamorfismo ocorreu sob condições de elevada razão fluido/rocha, resultando em disseminações de carbonato nos metacherts, metapelitos, filitos carbonosos, clorita xistos e rochas ultrabásicas, bem como vênulas de carbonato nas rochas calcissilicáticas. As lentes de rochas ultrabásicas apresentam fenoblastos de tremolita, mimetizando ou truncando a foliação definida pelo alinhamento de lamelas de talco. Esses fenoblastos aparecem corroídos por dolomita ao longo de fraturas intergranulares. As relações texturais dos fenoblastos de tremolita sugerem que as rochas ultrabásicas foram submetidas ao metamorfismo de contato sob condições de elevada disponibilidade de fluidos carbônicos.

Na Serra do Moinho, onde ocorre o depósito Ogó, a carbonatação das rochas é um dos tipos de alteração mais frequente, por isso a escala de abrangência e o modo de ocorrência dos carbonatos foram os critérios adotados para subdividir essa alteração  em (I) escala de campo mineiro e (ii) escala de depósito.

Carbonatação em escala de campo mineiro

A carbonatação  de campo mineiro refere-se à alteração pervasiva que produziu carbonatos disseminados nos diversos tipos de rochas na Serra do Moinho. Os difratogramas de raios X revelaram que a dolomita é a variedade de carbonato que ocorre nas rochas ultrabásicas, enquanto que a calcita ocorre nas demais rochas.

Nas rochas calcissilicáticas, metacherts e turmalinitos, a calcita é caracterizada  pela (i) depleção dos isótopos pesados de carbono, (ii) pronunciada dispersão do conteúdo de d18O, situada no intervalo de 11,21 até 19,71 ‰, e (iii) estreita variação do conteúdo de d13C, situada no intervalo -3,83 a -2,79  ‰.

Os metassedimentos químicos da Serra do Moinho contêm menos d18O do que os carbonatos marinhos de qualquer idade. O decréscimo em d18O, concomitante à uniformidade no conteúdo de d13C, provavelmente foi favorecido  pela mistura do CO2 marinho com fluidos juvenis derivados da atividade fumaroliana no ambiente deposicional (Veizer et al. 1989). A depleção simultânea em d18O e d13C em relação aos carbonatos marinhos pode ter sido ampliada pela descarbonatação metamórfica como sugere a substituição da grunerita pelo carbonato nos metacherts.

  Carbonatação em escala de depósito

  Abrange a alteração restrita ao depósito Ogó. Está representada por calcita em brechas hidráulicas, em fraturas nos veios e raras disseminações nos metacherts. Nos veios e em faixas milimétricas de alteração que envolvem essas estruturas, o carbonato corrói os sulfetos precoces. O valor médio de d13C apresentado pelos carbonatos é de -8,34 , aproximando-se da assinatura dos fluidos juvenis, cujo d13C é da ordem de -7 ‰ (Hoefs 1978).

O desvio isotópico mostrado  por esses carbonatos em relação aos fluidos juvenis pode ser atribuído ao metamorfismo das rochas, como sugere a distribuição dos atributos isotópicos dos carbonatos no espaço d13C versus d18O (Fig. 1). Esse padrão de distribuição caracteriza tanto os carbonatos derivados do metamorfismo de contato acompanhado da infiltração de fluidos magmáticos (Valley 1986) como aqueles associados a granitóides alojados durante o pico do metamorfismo regional (Rumble et al. 1986; Hoisch 1987; Wickham & Taylor 1987; Chamberlain & Rumble 1988; Ferry 1992). Outras evidências do metamorfismo superimposto à camada mineralizada compreendem a textura granoblástica da pirrotita e as marcas de recristalização da matriz de quartzo impressa na superfície dos cristais de  ouro nativo.

Características isotópicas dos filitos carbonosos

Em todo registro geológico, a assinatura do d13C orgânico  é da ordem de -26±7 ‰, com uma dispersão entre -50 e -10 ‰ (Schidlowski 1988).  No depósito Ogó, o conteúdo de d13C dos filitos carbonosos situa-se no intervalo compreendido entre -9,70 e -9,41 ‰. O baixo conteúdo de d13C  dessas rochas sugere que importantes mudanças pós-deposicionais foram promovidas pela degradação térmica da matéria orgânica durante o metamorfismo. Teoricamente, esse processo resulta no aumento da cristalinidade do material carbonoso, o qual pode ser identificado nos  padrões de difração de raios X e na reflectância ótica. A recristalização da matéria orgânica é acompanhada pelo decréscimo na proporção de H/C e pela perda de carbono leve (Strauss 1986; Schoell & Wellmer 1981).

No depósito Ogó, os filitos carbonosos foram submetidos ao metamorfismo do fácies xisto verde alto a anfibolito, que  estabilizou um material com cristalinidade transicional entre a matéria orgânica e a  grafita. O aquecimento dos filitos carbonosos promovido pelo metamorfismo termal poderia explicar o desvio de 16 ‰ no conteúdo de d13C em relação ao carbono biogênico.

Análise estatística dos dados de d13c e d18o no depósito Ogó

A projeção dos atributos isotópicos dos carbonatos no diagrama binário d13C versus d18O (Fig.1) realça as diferenças isotópicas da carbonatação em escala de campo mineiro daquela restrita ao depósito. No primeiro caso, os valores de d13C são uniformes com média de -3,44 ‰, contrastando com a ampla dispersão de d18O caracterizada pela variância da ordem de 14,11. Em escala de depósito, o conteúdo de d13C e de d18O dos carbonatos nos veios é uniforme (Fig. 1).

A assinatura isotópica dos carbonatos que ocorrem em vênulas que seccionam as rochas calcissilicáticas é moderadamente correlacionável com aquela apresentada pelos carbonatos  nos veios  como demonstram os resultados da regressão linear (r2= 0,25), bem como o  rank de Spearman (r= 0,7714, com nível de significância de 0,0845) e  o  rank de Kendall (t= 0,60, com nível de significância de 0,0909). A correlação positiva do conteúdo isotópico desses carbonatos reflete a significativa contribuição dos fluidos gerados pelo metamorfismo, quer seja de contato ou regional.

Os cálculos estatísticos destacam a baixa variância do conteúdo de d13C dos filitos carbonosos da ordem de 0,021. A uniformidade isotópica dos filitos carbonosos em escala de depósito reflete a homogeneidade imposta pelo metamorfismo.

Conclusões

As reações metamórficas participaram diretamente na  produção de CO2, propiciando a carbonatação das rochas adjacentes ao depósito Ogó. Os atributos isotópicos dos carbonatos revelaram que:

 O metamorfismo modificou a assinatura de d13C da matéria orgânica, através da perda de carbono leve.

 A calcita disseminada nos metacherts e aquela que ocorre nas brechas hidraúlicas e  veios do depósito Ogó foi originada pela mistura de fluidos magmáticos ou juvenis com soluções metamórficas.

 Os metassedimentos químicos contém carbonatos derivados da atividade fumaroliana, cujo conteúdo de d13C e  d18O foi simultâneamente depletado devido ao metamorfismo.

As paragêneses e relações texturais dos minerais de minério sugerem que o metamorfismo propiciou a remobilização do minério em escala de depósito e a  carbonatação pervasiva em escala de campo mineiro.

  Agradecimentos

     os autores registram seu apreço ao Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), Universidade de São Paulo,  através dos doutores R.L. Victória e L. A. Martinelli pela realização das análises apresentadas neste trabalho.

 

Referências bibliográficas

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  Figura 1- Distribuição dos dados isotópicos de d13C e d18O dos carbonatos na área do depósito Ogó.