UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA /INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

TESE DE DOUTORADO No 11

FLÁVIO HENRIQUE FREITAS E SILVA

METALOGÊNESE DO DEPÓSITO DO MORRO DO OURO, PARACATU - MG
DATA DA DEFESA:23/09/96
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO:PROSPECÇÃO E GEOLOGIA ECONÔMICA
ORIENTADOR: PROF. MARCEL AUGUSTE DARDENNE(UnB)
EXAMINADORES: PROF. ROBERTO VENTURA SANTOS (UnB)
PROF. CLAUDINEI GOUVEIA DE OLIVIEIRA (UnB)
PROF. ROBERTO PEREZ XAVIER (UNICAMP)
PROF. CARLOS ALBERTO ROSIÈRE (UFMG)

RESUMO

O depósito do Morro do Ouro, localizado a norte da cidade de Paracatu (Noroeste de Minas Gerais), está encaixado nos filitos carbonosos da base da Formação Paracatu (Membro Morro do Ouro). Regionalmente, o Membro Morro do Ouro inicia-se por filitos carbonosos, tendo em sua base um fino, mas persistente nível de quartzito (2 a 10 metros de espessura). Para o topo, os filitos carbonosos passam gradacionalmente aos sericita-quartzo filitos do Membro Serra da Anta da mesma formação. Em termos de geologia de mina, os filitos mineralizados foram subdivididos nas unidades (da base para o topo): MO-B2 (rocha fresca), MO-B1 (rocha levemente oxidada), MO-T (nível de transição entre a rocha fracamente alterada para fortemente oxidada), MO-C (filito fortemente oxidado) e MO-L (crostas lateríticas endurecidas), as quais representam um típico perfil de intemperismo. Os filitos carbonosos não mineralizados foram denominados Unidade MO-A, situada na lapa do minério, e MO-D na capa. Regionalmente, os filitos carbonosos não mineralizados apresentam um teor médio de ouro ("background") em torno de 0,1 ppm, constituindo o protominério do depósito e definindo o forte controle litoestratigráfico, não só do depósito do Morro do Ouro, como de várias outras ocorrências encaixadas no Grupo Canastra, conhecidas no setor meridional da Faixa Brasília.
Na região a norte do depósito, o nível guia do quartzito basal é repetido por cavalgamento interno no Membro Morro do Ouro. Na região do depósito do Morro do Ouro, ocorrem duas repetições do nível de quartzito basal, arranjadas em um grande duplex composto por dois cavalos, estruturado em rampa frontal (Nl0W/l5SW), patamar horizontalizado e rampas laterais encobertas (culminações laterais). A nucleação dos cavalgamentos internos no Membro Morro do Ouro foi condicionada pela geometria do anteparo dos "fronts" dos cavalgamentos, correspondendo a regiões de menor resistência à propagação dos empurrões, situadas entre dois grandes blocos rígidos compostos pelos biohermas recifais da Formação Vazante.
Esta geometria em duplex responde pelo controle estrutural da mineralização, a qual propiciou a formação de zonas transtensivas nos setores horizontalizados (patamares), onde a pressão normal resultante foi cerca de 10 a 40% menor que nas rampas frontais. A mineralização está condicionada às lascas de teto do patamar do duplex. O controle estrutural estabelecido pela presença dos patamares é também observado em outras áreas mineralizadas como na Fazenda Lavras, situada a cerca de 30 Kms a norte do Morro do Ouro, e nos depósitos de Santa Maria, Japonês, Igrejinha, Córrego Falcão, Lavadeiras, Rosário e Cabeça Seca no Município de Luziânia (GO).
Em termo de metamorfismo, as paragêneses minerais indicam condições metamórficas da Fácies Xisto Vede na zona da clorita, em torno de 2000 a 3000 bares e entre 350 e 380oC. As pequenas diferenças de paragêneses observadas entre os filitos não mineralizados e mineralizados refletem a maior pressão de fluido (especialmente a pressão parcial do CO2) na zona mineralizada.
O balanço de massa entre os filitos mineralizados (Und. MOB2) e não mineralizados (protominério = unidades MO-A e MO-D) evidenciou um processo com um ganho de volume em torno de 6% para as rochas mineralizadas, e aproximadamente isoquímico para maioria dos elementos. Na zona mineralizada, ocorreu um enriquecimento dos elementos voláteis (H2O, C, S, e As) na fase fluída e dos elementos facilmente solubilizáveis e complexáveis na forma de tio e arsenocomplexos entre os quais destaca-se o ouro. O enriquecimento de ouro, partindo-se do protominério (MO-A) com teor médio de 0,1 g/t e chegando a um minério com teor de 0,39 g/t (Und. MO-B2), foi da ordem de 310%, correspondendo a um aumento de massa de 0,3g.
As paragêneses, a geoquímica do minério e o estudo de inclusões fluidas estabelecem condições P-T-X semelhantes às condições obtidas a partir das paragêneses metamórficas, e uma baixa razão Fluido/Rocha, refletindo a origem metamorfogênica dos fluidos. Estas feições, associada a ausência de alteração hidrotermal, mostram um fluido mineralizante em equilíbrio com as rochas encaixantes, apontando os próprios filitos carbonosos do Membro Morro do Ouro como a fonte dos fluidos.
O estudo de inclusões fluidas e da química mineral do minério mostrou que ocorreram variações significativas na atividade do enxofre, a qual oscilou entre 10-12 e 10-8 bares, e na fugacidade de oxigênio, que variou entre 10-33 e 10-28 bares. Entretanto, a variação na fugacidade de oxigênio foi fortemente controlada (tamponada) pelo material carbonoso das encaixantes, ocorrendo ao longo do limite de saturação do carbono no fluido. Estas variações ocorreram em resposta a um constante processo de efervescência do fluido mineralizante, dominado pela água, com quantidades apreciáveis de CH4, CO2, N2, ± NaCl e traços de HS-/H2S e hidrocarbonetos em cadeias, sendo um importante mecanismo de precipitação do ouro.
A presença de altas concentrações de CH4 e N2, traços de hidrocarbonetos em cadeias e de HS- nas inclusões fluidas indicam a derivação endógena do fluido e a participação dos tiocomplexos e dos arsenietos/tioarsenietos no transporte do ouro. A desestabilização destes complexos foi fortemente promovida em resposta ao abaixamento da atividade de H2S, pelas variações da ¦ O2 no fluido e, possivelmente, pela diminuição da pressão dos fluidos, ocorrida em função do processo de efervescência.
A geoquímica isotópica do depósito, feita através dos isótopos estáveis C, O, H e S e radiogênicos 87Sr/86Sr em carbonatos, Rb/Sr em rocha e Pb/Pb em galenas, fornece argumentos favoráveis à origem metamorfogênica da mineralização, à atuação do processo de efervescência e à derivação endógena do fluido mineralizante e dos metais. A razão Fluido/Rocha da mineralização, estabelecida através dos isótopos, foi de 1:4, sendo compatível com a razão fluido/rocha que ocorre em pelitos sofrendo metamorfismo na Fácies Xisto Verde Baixo.
Os isótopos radiogênicos (Rb/Sr, K/Ar e Pb/Pb) definiram uma idade em torno de 680 Ma para a mineralização e para o metamorfismo, e uma idade em torno de 1000 a 1300 Ma para os filitos carbonosos encaixantes.
Após o processo de mineralização "primária", ocorreu um enriquecimento supergênico do ouro. O balanço de massa do processo supergênico, realizado entre as unidades MO-B2 e MO-C, mostrou um processo aproximadamente isovolumétrico, mas não isoquímico. Neste processo, o enriquecimento do ouro foi em torno de 40% em termos de concentração, corespondendo a um ganho de massa de 0,16 g/t.
A caracterização metalogenética do depósito do Morro do Ouro estabelece três controles fundamentais para a prospecção de depósitos do TIPO MORRO DO OURO:
1) litoestratigráfico: as mineralizações de grande porte estão condicionadas ao "protominério", representado pelo Membro Morro do Ouro da Formação Paracatu do Grupo Canastra;
2) estrutural: os depósitos ocorrem em zonas transtensivas horizontalizadas, representadas por patamares de duplex.
3) metamorfogênico: os depósitos estão condicionados à Fácies Xisto Verde Baixo e aos fluidos metamórficos gerados na própria pilha dos filitos carbonosos. A razão Fluido/Rocha (F/R = 0,25) restringe as mineralizações a depósitos com baixos teores e grandes volumes.
A formação do depósito se deve ao gradiente de pressão normal ao longo de uma estrutura em duplex, com os fluidos metamórficos migrando das zonas inclinadas para as zonas horizontalizadas, onde a ocorrência de um processo de efervescência contínuo promoveu variações físico-químicas significativas, que propiciaram a desestabilização de tio e arsenocomplexos e, consequentemente, a precipitação do ouro.


  
 
UNIVERSITY OF BRASILIA / INSTITUTE OF GEOSCIENCES

PhD THESIS No 11

FLÁVIO HENRIQUE FREITAS E SILVA

METALLOGENESIS OF THE MORRO DO OURO GOLD DEPOSIT, PARACATU, MINAS GERAIS STATE-BRAZIL
DATE OF ORAL PRESENTATION: 23/09/96
TOPIC OF THE THESIS: PROSPECTION AND ECONOMIC GEOLOGY
SUPERVISOR: PROF.MARCEL AUGUSTE DARDENNE (UnB)
COMMITTEE MEMBERS:PROF. ROBERTO VENTURA SANTOS (UnB)
PROF. CLAUDINEI GOUVEIA DE OLIVIEIRA (UnB)
PROF. ROBERTO PEREZ XAVIER (UNICAMP)
PROF. CARLOS ALBERTO ROSIÈRE (UFMG)

ABSTRACT

The Morro do Ouro Gold deposit is localized immediately to the north of the Paracatu Town (northwest of the Minas Gerais State). It is hosted by carbonaceous phyllites at the base of the Paracatu Formation (Morro do Ouro Member). A thin, but regionally continuos, quartzite stratum (2 to 10 meters) occurs at the base of the Morro do Ouro Member and constituted a guide level. Toward the top, the carbonaceous phyllites pass gradationaly to the sericite-quartz-phyllites of the Serra da Anta Member of the same formation. In the context of the mine geology, the mineralized phyllites were divided in the follows units (from base to top): MO-B2 (fresh rocks), MO-B1 (weakly weathering rocks), MO-T (transition level between weakly and strongly weathering rocks), MO-C (strongly weathering rocks) MO-L (lateritic hard crusts); which represent a typical lateritic profile. The unmineralized phyllites were named as MO-A in the footwall and MO-D in the hanging wall. The unmineralized phyllites has a background gold values about 0,1ppm and constituted the protore of the mineralized section.
In the deposit region, internal thrusts in the Morro do Ouro Member, arranged in a duplex structure, provocated two repetitions of the basal portions and in which could be individualized the frontal ramp (N10W/15SW), horizontalised flat and lateral culminations. In this duplex structure, the generation of a transtensive zone in the flat, where the resultant normal pressure was about 10 to 40% less than in the frontal ramp, conditioned the fluid migration towards the horizontalized zones and in this way is responsable for the strong structural control of mineralization.
The mineral paragenesis of the mineralized and unmineralized phyllites define conditions of greenschist facies, between 2000 and 3000 bars and 350 and 380oC. The small paragenesis differences observed are due to the higher fluid pressure (specially the CO2-CH4-N2 partial pressures) in the mineralized zones.
The mass balance characterization between the mineralized (MO-B2 unit) and the protore (MO-A/MO-D units) showed a process with about 6% of volume gain and almost isochemical to the majority of the elements. In the mineralized zone there was a marked enrichment of volatile, base metals and gold. The gold enrichment, beginning from the protore (MO-A unit) with 0.1 g/ton initial gold content until a 0.39 g/ton gold content in the mineralized rock (MO-B2 unit) was about 310% corresponding to a mass increase of about 0,3 g/ton.
The ore paragenesis, geochemistry and fluid inclusion studies revealed a low fluid rock ratio and the same P-T-X conditions determined by metamorphic paragenesis, reflecting the metamorphogenic fluid origin. The fluid inclusions and mineral chemistry studies evidenced significative variations in the sulfur and oxygen fugacities that oscillated respectively between 10-12 - 10-8 and 10-33 - 10-28. However, the oxygen fugacitie variations was buffered by carbonaceous matter along to the saturation limit of the carbon in the fluid. These variations occurred in response to continuous effervescence process of the mineralized fluid which was water dominated with important quantities of CO2, CH4, N2, ± NaCl and traces of HS-/H2S and low chain hydrocarbons. The fluid chemistry evidenced a endogenous derivation and pointed the gold transport as thiocomplex and arseniate/thioarseniate.
The isotopic geochemistry (C, O, H, and S stable and Sr/Sr, Rb/Sr, Pb/Pb radiogenic isotopes) provide additionally evidences for the endogenous/metamorphogenic origin of the mineralization and to effervescence process also indicating a fluid/rock ratio about 1:4, compatible with low greenschist metamorphic conditions. The radiogenic isotopes pointed a 1300 my for the hosted phyllites and about 680 my for the mineralizantion event.
After the primary mineralization process there was a supergenic enrichment of the gold in response to almost isovolumetric but not isochemical process which resulted gold enrichment of the MO-B2 toward MO-C units of the about 40% (in concentration) and 0,16g/ton of the mass gain.
In a general conclusion, the Morro do Ouro Gold Deposit origin was due to metamorphic fluid channelization toward the horizontal foliation zones in response the normal pressure gradient established along of a duplex structure and related to continuous effervescence process which promoted physical-chemistry variations that unstabilized a dominant solubilized gold-thio/arsenocomplex and consequently causing gold precipitation.