UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA - INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO No 170

ÉRICA GONÇALVES GRAVINA

QUÍMICA MINERAL DE PEROVSKITA E GEOQUÍMICA DE ROCHA EM ARENITOS DO GRUPO BAURU, TRIÂNGULO MINEIRO
Data da defesa: 17/02/2003
Área de Concentração: Mineralogia E Petrologia
Orientador: Prof. José Affonso Brod (UnB)
Examinadores: Prof. José Carlos Gaspar (UnB); Prof. Excelso Ruberti (USP)

Palavras Chaves: perovskita, Formação Uberaba, proveniência.

RESUMO

A Bacia Bauru abrange áreas dos Estados do Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Paraná, sendo dividida nos grupos Caiuá e Bauru. No Triângulo Mineiro ocorre apenas o Grupo Bauru, representado pelas formações Uberaba e Marília. Este grupo tem despertado interesse pela grande quantidade de detritos de rochas alcalinas em algumas de suas unidades, como a Formação Uberaba, com conseqüente potencial para diamante, além de outros componentes derivados de rochas alcalinas. Os arenitos da Formação Uberaba destacam-se por conter quantidades expressivas de perovskita, o que os torna ideais para estudos cristalográficos e químicos deste mineral.
Neste trabalho foram analisadas amostras de arenitos das formações Uberaba e Marília. Foi também estudado um conglomerado diamantífero, com posição estratigráfica indeterminada, do Garimpo do Bandeira, no intuito de investigar sua possível correlação com conglomerados diamantíferos da base da Formação Uberaba, como os da região de Romaria.
A Formação Uberaba, nas regiões de Uberaba e de Conceição das Alagoas, é composta por conglomerados, arenitos conglomeráticos e arenitos ricos em fragmentos líticos de origem vulcânica (basaltos e rochas alcalinas), perovskita (até 25%), diopsídio, olivina, granada (melanita) e Ti-magnetita.
O afloramento estudado da Formação Marília consiste de conglomerados, arenitos conglomeráticos e arenitos, todos intensamente cimentados por carbonato. Onde a cimentação foi mais intensa o carbonato substitui grande parte da rocha, gerando níveis de calcretes. Os componentes detríticos são principalmente quartzo e feldspatos, com contribuição de rochas do embasamento (quartzitos, xistos) e de basaltos, com quantidades apenas subordinadas de detritos de rochas alcalinas. Perovskita e piroxênio ocorrem apenas como traços, e a granada é do tipo almandina.
Os resultados de refinamento de estrutura cristalina pelo método de difratometria de raios x em monocristal revelaram que a perovskita da Formação Uberaba pertence ao sistema ortorrômbico (P b n m) com cela unitária distorcida com dimensões a = 5,3740 Å, b = 5,4480 Å e c = 7,6320 Å,  =  = 90o e  = 90,000 (3)o . As análises de Microssonda Eletrônica mostram que esta perovskita é constituída dominantemente de CaTiO3 (> 90% em proporção molecular), com quantidades apreciáveis de elementos terras raras (ETR). O somatório de ETRL (La, Ce, Nd e Sm)varia de 6704 a 56694 ppm, enquanto os teores de Y situam-se entre 78,74 e 818 ppm.. Análises por LAM-ICP-MS em perovskita demonstram o caráter fortemente fracionado dos ETR, com enriquecimento dos elementos leves (somatório de ETRL entre 9143 e 11798 ppm) em relação aos pesados (somatório de ETRP entre 42,98 e 60,80 ppm). As correlações entre possíveis substituintes indicam que a solução sólida mais importante é entre perovskita sensu stricto (CaTiO3) e ETRFeO3, com contribuições menores de tausonita (SrTiO3), loparita [(Na0,5Ce0,5)TiO3] e lueshita (NaNbO3).
A perovskita da Formação Uberaba é semelhante em composição à perovskita dos kamafugitos e das rochas ultramáficas associadas a complexos carbonatíticos da Província Ígnea do Alto Paranaíba indicando que a Formação Uberaba deriva, em grande parte, da erosão das rochas daquela província alcalina. Isto é consistente com a posição topográfica elevada do Arco do Alto Paranaíba no Cretáceo Superior e com as direções de paleocorrentes da Formação Uberaba.
As rochas das formações Uberaba e Marília, e do Garimpo do Bandeira foram analisadas para elementos maiores, traços e terras raras em rocha total por ICP-AES e ICP-MS, e sua composição mineralógica foi investigada por difratometria de raios X nas frações  200 mesh e argila. Os resultados integrados deste estudo demonstraram uma importante contribuição das rochas alcalinas, especialmente kamafugitos e rochas ultramáficas de complexos carbonatíticos da Província Ígnea do Alto Paranaíba, na área fonte da Formação Uberaba. Os resultados para a Formação Marília revelaram uma contribuição pouco expressiva de rochas alcalinas na área-fonte, possivelmente dominada por rochas do embasamento e da Formação Serra Geral. Nas amostras do Garimpo do Bandeira não foi possível identificar evidências geoquímicas da influência de rochas alcalinas. O conteúdo de argilominerais da Formação Uberaba é compatível com derivação a partir de rochas máficas sob regime de intemperismo químico pouco intenso, compatível com o clima semi-árido predominante no Cretáceo Superior. A Formação Marília parece ter se formado ainda sob condições de clima seco, embora possivelmente menos severas. O conteúdo mineralógico da fração fina das rochas do Garimpo do Bandeira indica intemperismo químico intenso na área fonte, sugerindo que estas rochas formaram-se após o Cretáceo e não devem, conseqüentemente, ser correlacionadas aos conglomerados da Formação Uberaba.
Os resultados da presente pesquisa têm implicações importantes para a controvérsia sobre a origem do diamante detrítico no oeste de Minas Gerais. Pelo menos no caso do Garimpo do Bandeira, não foi possível estabelecer uma relação entre os conglomerados diamantíferos e as rochas alcalinas do Cretáceo, sugerindo que: 1) o diamante é derivado de fontes primárias mais antigas ou 2) a assinatura química e mineralógica do magmatismo cretáceo foi completamente eliminada por sucessivos ciclos de remobilização sedimentar entre o final do Cretáceo e o recente.


  
UNIVERSITY OF BRASILIA- INSTITUTE OF GEOSCIENCES

MSc THESIS No 170

ÉRICA GONÇALVES GRAVINA

MINERAL CHEMISTRY OF PEROVSKITE AND ROCK GEOCHEMISTRY IN SANDSTONES FROM BAURU GROUP, TRIÂNGULO MINEIRO, BRAZIL

DATE OF ORAL PRESENTATION: 17/02/2003
TOPIC OF THE THESIS: MINERALOGY AND PETROLOGY
SUPERVISOR: Prof. José Affonso Brod (UnB)
COMMITTEE MEMBERS:
Prof. José Carlos Gaspar (UnB); Prof. Excelso Ruberti (USP) 

Key Words: perovskite, Uberaba Formation, provenance.

ABSTRACT

The Bauru Basin includes part of the Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, São Paulo and Paraná States in Brazil, and comprises the Caiuá and Bauru Groups. Only the latter occurs in the Triângulo Mineiro region, represented by the Uberaba and Marília Formations. The large amounts of clastic material derived from alkaline rocks in some units of the Bauru Goup (e.g. the Uberaba Formation) has drawn the attention of researchers, since these rocks could potentially be diamond-bearing. In addition to other alkaline rock-derived clastic components the Uberaba Formation sandstones and conglomerates are distinguished by large amounts of perovskite, which makes them an ideal source material for crystallographic and chemical studies of perovskite.
Sandstones from the Uberaba and Marília Formations were investigated during this research. A diamond-bearing conglomerate of unknown stratigraphic position, from the Garimpo do Bandeira locality, was included in the study, in order to investigate a possible correlation of this rock with diamond-bearing conglomerates of the Uberaba Formation such as those in the Romaria region of Minas Gerais.
The Uberaba Formation, was studied near the cities of Uberaba and Conceição das Alagoas. It is composed of conglomerates, conglomeratic sandstones and sandstones containing large amounts of lithic fragments of volcanic origin (basalts and alkaline rocks), perovskite (up to 25%), diopside, olivine, garnet (melanite) e Ti-magnetite.
The studied outcrop of the Marília Formation comprises conglomerates, conglomeratic sandstones and sandstones. All rock-types are strongly cemented by carbonate. Where cementing was more extensive a calcrete levewl developed, leaving rare remnants of the original rock. The main clastic components are quartz and feldspars, with subordinate amounts of fragments of basement (quartzite, schist) rocks and basalt. The contribution of clastic material from alkaline rocks is very small. Perovskite and pyroxene occur only in trace amounts and the garnet is almandine-type.
The results of structure refinement by single crystal x-ray diffractometry indicate that the perovskite from the Uberaba Formation is orthorrombic (P b n m), with a distorted unit cell whose parameters are a = 5,3740 Å, b = 5,4480 Å e c = 7,6320 Å,  =  = 90o e  = 90,000 (3)o. Electron microprobe analyses show that this perovskite is composed of more than 90 mol % CaTiO3, where rare earth elements (REE) are the main substitution cations. The sum of the light REE (La, Ce, Nd e Sm) ranges from 6704 to 56694 ppm, whilst the Y content ranges from 78,74 to 818 ppm. The results of LAM-ICP-MS analyses on selected perovskite grains demonstrate the strongly fractionated character of the REE, whereby the sum of the light REE ranges from 9143 to 11798 ppm, and the sum of the heavy REE varies from 42,98 to 60,80 ppm. Mutual correlation between the probable substituting cations show that the main solid solution in place is between perovskite (CaTiO3) and REEFeO3, with minor participation of the tausonite (SrTiO3), loparite [(Na0,5Ce0,5)TiO3] and lueshita (NaNbO3) end-members.
The perovskite from the Uberaba Formation is similar in composition to that of kamafugites and plutonic alkaline rocks associated to carbonatite complexes of the Alto Paranaíba Igneous Province (APIP), suggesting that the sedimentary rocks derived, to a considerable extent, from the erosion of the alkaline rocks of that province. This is consistent with the Alto Paranaíba Arch being a structural high during the Late Cretaceous, and with paleocurrent directions reported in the Uberaba Formation.
Samples from the Uberaba e Marília Formations, and from the Garimpo do Bandeira, were analysed for major, trace and rare-eatrh elements by ICP-AES e ICP-MS, and their mineralogy in the < 200 mesh and clay fractions was determined by X-ray diffractometry. The results obtained demonstrate that the source area for the Uberaba Formation contained important amounts of alkaline rocks, especially kamafugites and plutonic rocks associated to the APIP carbonatite complexes. The source area for the Marília Formation had a less important contribution of alkaline rocks, and was possibly dominated by basement and the Paraná Basalts (Serra Geral Formation). No chemical evidence of alkaline rock contribution in the source area for the Garimpo do Bandeira rocks was found. The clay mineral content of the Uberaba Formation rocks is consistent with derivation from mafic rocks under little chemical weathering, which agrees well with the arid climate conditions thought to have prevailed during the Late Cretaceous in the region. The Marilia Formation appears to have formed still under dry, but perhaps attenuated climatic conditions. The mineralogical content in the fine-grained fraction of the Garimpo do Bandeira rocks indicates extensive chemical weathering and, therefore, wet climatic conditions, suggesting that these rocks postdate the Late Cretaceous and should not be correlated with the Uberaba or Marília Formations.
The results of this research have implications for the long-term controversy on the origin of the Western Minas Gerais alluvial diamond. At least in the case of Garimpo do Bandeira, it was not possible to establish a direct relationship between the diamond-bearing conglomerate and the Late Cretaceos alkaline rocks of the APIP. This suggests that: either 1) the diamond in Garimpo do Bandeira comes from older primary sources or 2) successive sedimentary reworking cycles between the end of the Late Cretaceous and the deposition of the conglomerate were able to successfully wipe out the chemical and mineralogical signature of the APIP magmatism.