REVELANDO A TRISTEZA
As flores de nosso arrabalde

Texto de jornal de circulação local

Na década de vinte, a zona sul de Porto Alegre ainda era muito silvestre, motivo pelo qual era procurada por pessoas sensíveis às coisas da natureza. Pela margem do Guaíba, desde Tristeza até Ipanema, estendia-se uma mata virgem, rica em orquídeas. Devido à paisagem natural e a um clima agradável, as praias e as colinas da Tristeza eram procuradas por elementos estrangeiros, especialmente alemães. Ao lado das orquídeas surgiu o cultivo das mais variadas qualidades de flores, rosas, begônias, cravos, palmeiras etc. Esta exploração era feita por pessoas cultas, ou como lazer ou como profissão, que organizavam exposições e concursos, atribuindo taças, medalhas e diplomas aos mais destacados. Podemos afirmar que a floricultura de Porto Alegre nasceu na Tristeza.

As exposições eram realizadas na capital, geralmente de agosto a outubro, dela participando também elementos de outros arrabaldes da cidade.

Resumiremos os eventos e seus principais participantes da zona sul:

1916 - 1ª Exposição de Flores;

1917 - 2ª Exposição de Flores;

1918 - 3ª Exposição de Flores;

1919 - Não houve, devido ao mau tempo.

Em todas elas, vários floricultores daqui sempre participaram.

1920 - A 4ª Exposição de Flores realizou-se nos Saguões do suntuoso Palácio Piratini, obra encomendada aos franceses e recém concluída. Foi uma exposição geral, de rosas, begônias, palmeiras, cravos etc. Classificou-se em 1º lugar, o Sr. João Carlos Dreher Sobrinho. Essa exposição contou com as mais lindas e delicadas cravinas, colecionadas pelo Dr. Alberto Campos Velho, médico residente na Estrada dos Emigrantes, mais tarde chamada Faixa Preta e hoje, Rua Dr. Campos Velho. Para essa exposição, o presidente do estado, Dr. Antônio Augusto Borges de Medeiros, além de ceder o prédio do governo, ainda custeou as despesas do evento.

1921 - A 5ª Exposição de Flores diversas foi realizada juntamente com a 1ª Exposição de Orquídeas, na Sociedade Leopoldina. De nosso arrabalde, participaram, com orquídeas: Otto Niemeyer: 150 exemplares; Bernardo Dreher: 150; Ernesto Barth: 150; Walter Dreher: 50; Adolfo Riter: 50; Alberto Bopp: 50; João Galdolfi: coleção de cravos.

1922 - A 6ª Exposição de Flores realizou-se a 18 de agosto, tendo como local o lindo palacete da Faculdade de Medicina, à Avenida Redenção. Além dos expositores tradicionais, a novidade foi a exposição de plantas aquáticas do Sr. Alfredo Carls e seus peixinhos, trazidos do Rio Gravataí. O programa constou de três noites de festas, organizadas por elementos de nosso meio social, tendo como diretora a senhorinha Sybilla Fontoura.

Mas o destaque da exposição correu por conta do secretário da mesma, Sr. João Carlos Dreher Sobrinho, que apresentou sua linda coleção de rosas (Possuía ele a maior coleção de rosas do Brasil, cerca de 6.000 rosas!)

1923 - A 7ª Exposição realizou-se em 19 de outubro. Daí para diante repetiram-se pequenas mostras, sem caráter oficial, até cessar na década de trinta.

Na década de quarenta, reiniciaram-se as exposições. Comemorativa ao Bicentenário de Porto Alegre, tivemos em 1940 uma grande exposição no Clube Comercial de Porto Alegre. Nessa exposição obteve o 1º lugar o Sr. Walter Winge, ganhando quatro medalhas de ouro e duas de prata.

Tristeza não foi só o berço da floricultura gaúcha, foi também o local onde se implantou os primeiros estudos científicos e o trabalho de assistência ao agricultor. Isto, graças a Josef Winge, participante da 1ª Exposição Agrícola de Porto Alegre, em 1901, e criador do "Sindicato Agrícola da Tristeza", em 1910. Foi ele, seguido por seu filho Walter, que adquiriu, em 1929, o viveiro de rosas de seu Carlos Dreher e que até hoje é seguido por seus sucessores, no ramo comercial de mudas de plantas frutíferas e ornamentais, com o nome de Garden Center.

Mas no mundo da flores foi João Carlos Dreher Sobrinho quem mais de destacou. No início do século descobriu o berço floral em nossas matas. Logo adquiriu uma gleba de terra na Pedra Redonda, de Samuel Auervale, que posteriormente foi acrescida com a aquisição da chácara, com casa, do Banco Nacional do Comércio. Carlos Dreher foi um capítulo a parte. Forte comerciante, apaixonado pela floricultura, desenvolveu técnicas próprias de cultivo e aperfeiçou a arte fotográfica, documentando assim seus exemplares. Não satisfeito, viajou para a Alemanha em 1917, trazendo para cá a técnica da revelação da fotografia colorida. Seu acervo de fotos, guardado por seu filho Joãozinho, é espantoso.

Com seus irmãos Bernardo e Walter, foi o introdutor do cultivo em estufas. Viajava para os grandes centros, como Rio, São Paulo, Montevidéu e Buenos Aires, a cata de novidades no ramo da floricultura.

Em 19 de outubro de 1923, recebeu como prêmio à floricultura, uma estatueta de bronze VICTORIA, de 40cm de altura, doada por Dona Carlinda Borges de Medeiros, e uma taça de prata, que regula a mesma altura, oferecida pela Protetora do Turf.

Seu irmão Bernardo Dreher deixou um herdeiro do ramo, o Sr. Rodolfo (Rudy), que até hoje cultiva orquídeas.

Mas Tristeza teve mais gente: Alfred Prinzler que, com seu irmão Fritz, também no início do século, instalou sua floricultura na Rua Dr. Armando Barbedo. Possuía uma loja, "Casa Flora", na Rua dos Andradas, para onde diariamente se dirigia com a caminhonete carregada de flores. também foi seguido por seu filho Willy, até 1976. Hoje seu Willy conserva a floricultura mais como lazer e recordação.

Na zona sul vamos encontrar ainda: Floricultura Dario, na Estrada Eduardo Prado; Floricultura Caliandra, na Rua Dr. Campos Velho (Cristal); Floricultura Quero-Quero, na Estrada Costa Gama.

Nossos antigos floricultores receberam o apoio não só do Presidente Borges de Medeiros. É meritório lembrar o nome do Intendente Municipal, Dr. José Montaury de Aguiar Leitão, outro grande apreciador das flores. Exigia de seus subordinados o máximo de zelo com as praças, especialmente na época da primavera, e apoiava todas as exposições de flores.

Sob este aspecto, é uma tristeza a Tristeza de hoje, nem apoio, nem flores. E como diz o Presidente Marçal, do CCD: "Nosso arrabalde está se tornando uma selva de pedras e cimento".