O MESTRE CUCA
Cezar Gouvêa
No mesmo serviço em que contei o causo do Duda,
aconteceu, na estruturação da equipe de trabalho, que se deslocaria ao longo de
um trecho de quase quarenta quilômetros seguindo o eixo da rodovia BR-470, ainda
não implantada, portanto com dificuldades de acesso e transporte tanto dos
recursos de trabalho e subsistência, quanto de remessa das amostras coletadas
para o laboratório de mecânica dos solos, situado em Rio do Sul, que necessitei
admitir um cozinheiro de campo.
O Adão, tipo atarracado e forte, taciturno e de poucas
palavras, foi indicado pelo tropeiro que fazia os transportes nas "bruacas" em
cangalhas no lombo das mulas, natural da própria região de Pouso Redondo.
Algumas semanas após o incício do serviço, soube eu da história do Adão.
Estando a namorar a contragosto a filha de um pequeno proprietário de terra da
região, um dia foi confrontado pelo contrariado sogro e mais dois filhos homens
em uma vereda de perdidas paragens, que fizeram menção de sacar armas com
intuito nada pacífico.
Adão, num pulo felino saltou sobre o mais velho de forma que
esse, quando tocou o solo, já estava eficientemente degolado. Daí voou sobre um
dos prometidos cunhados , degolando-o também. Só não degolou o terceiro porque
esse rogou por tudo pela sua vida, enquanto o Adão já estava assentado sobre seu
peito com a "carneadora" à feição, sem que se diparasse um tiro sequer.
Adão foi condenado, cumpriu pena curta ditada pela extensão
do dano mas com a atenuante da desproporção dos recursos entre os contendores, e
assim veio a engajar-se em minha equipe, eu que não tinha nada a ver com isso.
A história assim me foi contada, e ficou evidente que os
demais participantes do grupo dela tiveram conhecimento.
Fato é que, se eu tivesse contratado um "maître" francês para a cozinha da expedição, não teria tido tanta unanimidade na aprovação da qualidade da comida servida...
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