OS PAPAFIGO ( II )
Manfredo Winge
No mapeamento regional em 1/250.000 da Folha de Patos-Paraíba, na região de Desterro-Cacimba da Areia-Passagem, tivemos outro lance da história relatada por Robert Dyer para as Notícias Shell (Veja a história dos papafigos).
As fotos aéreas que usávamos eram
antigas e algumas das estradas indicadas não davam para passar porque tinham sido
abandonadas. Por outro lado, algumas variantes não estavam registradas nas fotos,
dificultando a localização dessas novas estradas. Tínhamos que ir rotineiramente
marcando a lápis as estradas que permitiam acesso nas fotos aéreas.
O jeito era sempre perguntar para saber qual o melhor caminho.
Estranhamente, porém, já há vários dias, não víamos ninguém nas casas que
pareciam abandonadas.
Um dia aconteceu um lance esquisito: uma mulher ia na estrada e, ao nos
ver descer da rural para estudar um afloramento, pegou o filho pequeno debaixo do braço e
puxou o outro maiorzinho pela mão e escafedeu-se no meio das brenhas do mato como se
tivesse visto o diabo. Estes fatos somados ao relatado por Robert de que vários homens na
região de Taperoá o ameaçaram nos deixaram bastante desconfiados.
Nesta situação estávamos um belo dia, já de noitinha, tentando, sem sucesso,
obter informações de qual a melhor estrada para voltarmos a Patos onde estávamos
hospedados no Hotel JK quando, perto de uma encruzilhada, já no lusco-fusco do anoitecer,
vimos distante a luz de uma lamparina em uma casa. Fui a pé pelo descampado e ao
aproximar-me da casa vi que tinha uma porção de gente sentada em frente da casa.
Cerca de 100 metros da casa gritei: -
OH de casa !! e recebi como resposta: - Não venha se chegando gente ruim, seus papafigo .....
Ainda tentei retrucar: - nós somos gente
de bem.. não somos gente ruim, trabalhamos para o governo .. porém a
resposta final que recebi foi: - nóis num qué nada com
gente da laia de vansunceis..vai simbora sinão nóis manda bala...
Com este argumento definitivo, nem cheguei mais perto; dei meia volta e rapidinho voltei para a rural onde, mais uma vez, por erro e tentativa e com o uso da bússola, conseguimos seguir para o nosso destino onde chegamos bem tarde.
Felizmente, não precisamos voltar para a região "perigosa" pois concluíramos o nosso levantamento nessa área.
Buscando informações a respeito da "lenda dos papafigo", soubemos de pessoal do Ministério da Saúde que ela se originou quando um surto epidêmico de doença de Chagas exigiu o monitoramento da população infectada pelo Tripanossomo cruzii. passado pelo inseto barbeiro (chupão) provocando inchaço de baço e fígado e, muitas vezes, a morte. Para bem diagnosticar os focos de infecção, os agentes de saúde promoviam a necropsia das pessoas que morriam na região, fazendo a punção do fígado das pessoas mortas dentre as quais predominavam as crianças. A falta de esclarecimento da população deve ter originado a crença de que essas pessoas que vinham com carro preto (os agentes de saúde pública) queriam era
COMER O FÍGADO DAS CRIANCINHAS.
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