UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA /INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

TESE DE DOUTORADO No 9

MARCO ANTÔNIO FONSECA

ESTILOS ESTRUTURAIS E ARCABOUÇO TECTÔNICO DO SEGMENTO SETENTRIONAL DA FAIXA BRASÍLIA
DATA DA DEFESA: 29/02/96
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: GEOLOGIA REGIONAL
ORIENTADOR: PROF. MARCEL AUGUSTE DARDENNE (UnB)
EXAMINADORES: PROF. REINHARDT A. FUCK (UnB)
PROF. LUIZ JOSÉ HOMEN D'EL-REY SILVA (UnB)
PROF. MÁRIO CAMPOS NETO (USP)
PROF. ALBERTO PIO FIORI (UFPR)

RESUMO

Edificada no bordo ocidental do Cráton do São Francisco, a Faixa de Dobramentos Brasíliaestende-se por mais de 1.000 km na direção meridiana, através dos estados de Minas Gerais,Goiás, Distrito Federal e Tocantins. Polarizada e vergente em direção a essa entidadecratônica, a faixa é compartimentada pela Megaflexura dos Pirineus, uma sintaxe tectônica, na altura do paralelo da Capital Federal, em dois subcompartimentos, norte e sul. Engloba, além de terrenos da infra-estrutura, seqüências metasedimentares de idade proterozóica média a superior envolvidas na orogênese Brasiliana.
A análise estrutural regional realizada nestas seqüências, bem como em parte de seu embasamento, permitiu a caracterização de dois compartimentos tectônicos para a faixa em seu segmento setentrional: o cinturão de dobras e falhas de antepaís e o núcleo metamórfico.Esses compartimentos se distinguem por exibirem cinemática e estilo estrutural próprio, além de envolverem diferentes tipos de materiais. Limitam-se entre si por meio de grandes descontinuidades.O cinturão de dobras e falhas de antepaís corresponde à zona mais externa, adjacente ao Cráton do São Francisco. Pode ser, por seu lado, dividido em antepaís externo eantepaís interno. O antepaís externo engloba coberturas cratônicas (representadas pelo Grupo Bambuí) e parte das seqüências metasedimentares da faixa (Grupo Paranoá) afetadas por uma tectônica epidérmica. Essas rochas se deformam através de dobramentos flexurais, falhas sub-horizontais interestratais e duplexes cuja assimetria indica transporte de matéria para leste. O balanceamento da deformação da cobertura nesse segmento é em grande parte realizado pormeio de descolamentos horizontais (detachments) na interface do embasamento. Parte da deformação é ainda acomodada por meio de reativação de falhas transcorrentes enraizadas no embasamento. O padrão dos dobramentos, o desenvolvimento incipiente de trama metamórfica e a ocorrência de falhamento essencialmente rúptil permitem afirmar que os processos deformacionais vigentes nesse segmento da faixa operaram em níveis crustais superiores. O antepaís interno pode ser compartimentado em dois setores: sul e norte. Ao norte estão envolvidas seqüências metasedimentares (grupos Paranoá e Araí), além de terrenos do embasamento (e outros tipos de materiais a ele agregados) e da Formação Ticunzal, uma unidade litoestratigráfica ainda parcamente conhecida. Mostra uma tectônica thick skinned. A cobertura se deforma através de amplas dobras regionais, flexurais de deslizamento a flexurais de fluxo, com vergência para leste.
A deformação da cobertura é absorvida, ao nível do embasamento, por importantes sistemas de falhamentos reversos e transcorrentes. Assim, cabe destacar os sistemas Terezina- Nova Roma (frontal), Arraias -Campos Belos (oblíquo sinistral), Cavalcante - Terezina (lateral destral) e São Jorge - Alto Paraíso - Cormari (lateral destral). Um interessante aspecto da deformação nesse setor é que ela se concentra junto às principais descontinuidades desses sistemas. Desta maneira, fora das zonas de ação dos mesmos, extensas porções da cobertura e mesmo do embasamento foram poupadas dos processos deformacionais e mesmo metamórficos. A porção sul do antepaís interno é ocupada exclusivamente pelas seqüências metasedimentares da faixa, em grande parte representadas pelo Grupo Paranoá e subsidiariamente pelo Grupo Canastra. Esses mostram dobras mesoscópicas a megascópicas em geometria de kink com vergência para o antepaís. À medida que se avança para o oeste, em direção ao pós-país, os dobramentos tornam-se mais freqüentes na escala mesoscópica. Nesse setor, três alternativas de balanceamento da deformação da cobertura, a nível do embasamento são geometricamente possíveis: um descolamento na interface embasamento - cobertura, dois descolamentos, um na interface do embasamento e outro na porção média da cobertura e finalmente embasamento envolvido com empurrões cegos. Dados geológicos que confirmem uma destas hipóteses por ora não são disponíveis, seja em virtude da espessa cobertura sedimentar ou até mesmo devido à falta de critérios geológicos para tal. No entanto o perfil Bouguer, tomado próximo à transição para o núcleo metamórfico sugere que o embasamento, nesse setor, não deva estar estruturalmente elevado. O núcleo metamórfico externo compreende terrenos do embasamento (s.s) da faixa, bem como diversos tipos de materiais a ele agregados como seqüências vulcano-sedimentares, terrenos de arco, complexos máfico-ultramáficos, além de corpos graníticos, rochas alcalinas e outros materiais. A seqüência metasedimentar é representada pelo Grupo Serra da Mesa. Essa unidade mostra desenvolvimento generalizado de dobras passivas assimétricas a isoclinais nas mais variadas escalas, além de falhas de caráter dúctil. Mostra ainda a superposição de uma segunda fase de deformação, que se superpõe à trama da primeira fase. Essa porção da faixa é balizada por duas descontinuidades importantes: os sistemas Rio Maranhão a leste e Santa Teresa a oeste. Essas estruturas, que ocorrem no âmbito do Lineamento Transbrasiliano, se articulam num complexo sistema transpressivo destral. Este sistema mostra variado acervo estrutural: dobras en echelon com eixos oblíquos às principais falhas, falhas normais, além de zonas de releasing e restraning bend. A curvatura das principais falhas é interpretada como decorrente de uma colisão com obstáculos no antepaís, evidenciando o desenvolvimento local de curvatura oroclinal. Diferentemente dos modelos transpressionais descritos na literatura, este sistema, balizado por falhas inclinadas e envolvendo unidades infracrustais da faixa, bem como seqüências metamorfisadas no fácies anfibolito corresponde a um exemplo de um sistema transpressivo operando em sua raiz. A análise estrutural, conduzida desde o núcleo metamórfico externo do segmento norte e adentrando a sintaxe dos Pirineus, mostrou a existência de uma clara partição da deformação. Assim, tendo como referência o eixo da mesma, observam-se, a partir dele para norte, movimentos oblíquos destrais, transcorrentes destrais e frontais com componente oblíqua destral. Para sul, coligindo dados da literatura e integrando-os a algumas observações geológicas tomadas no segmento sul da faixa, verificou-se a mesma tipologia de partição da deformação, exceto pelo sentido geral que é sinistral. Considerando tal partição e tendo em vista os modelos correntes na literatura que respondem pela estruturação de cinturões curvos, a faixa Brasília é interpretada como um arco não rotacional decorrente da colisão de uma margem irregular na forma de um indentante. Isto porque as demais hipóteses não respondem seja pela inexistência de efeitos da curvatura no antepaís (colisão com obstáculos), seja pela ausência de falhas cartografadas ao longo do eixo da sintaxe que acomodassem a deformação (interação com sistemas transcorrentes). Esse indentante teria a forma de cunha com concavidade voltada para o antepaís, podendo ser representado por um promontório do embasamento, compatível com a forma da anomalia Bouguer negativa assinalada ao longo do Sistema Rio Maranhão. Admitindo-se essa hipótese e considerando a direção de encurtamento máxima para todo o cinturão como leste - oeste (direção compatível com o valor da direção modal da lineação mineral e ainda com alguns modelos geotectônicos que enquadram a Província Tocantins) e efetuando-se a decomposição da direção de encurtamento principal, a faixa Brasília se caracteriza como um cinturão transpressivo com uma componente marginal de cisalhamento.


  
 
UNIVERSITY OF BRASILIA / INSTITUTE OF GEOSCIENCES

PhD THESIS No 9

MARCO ANTÔNIO FONSECA

STRUCTURAL STYLES AND TECTONIC FRAMEWORK OF THE SETENTRIONAL SEGMENT OF THE BRASÍLIA BELT
DATE OF ORAL PRESENTATION: 29/02/96
TOPIC OF THE THESIS: REGIONAL GEOLOGY
SUPERVISOR: PROF. . MARCEL AUGUSTE DARDENNE (UnB)
COMMITTEE MEMBERS: PROF. REINHARDT A. FUCK (UnB)
PROF. LUIZ JOSÉ HOMEN D'EL-REY SILVA (UnB)
PROF. MÁRIO CAMPOS NETO (USP)
PROF. ALBERTO PIO FIORI (UFPR)

ABSTRACT

The Brasília fold and thrust belt is a major tectonic unit of the Tocantins Province is central Brazil. It extends for over a 1,000 km in a north - south direction. The general vergence of folds and thrust faults is towards the São Francisco Craton, a stable area that behaved as a foreland for several others Brasiliano fold belts. At parallel 16, the Brasília belt shows a major tectonic feature, termed Pirineus Bending. It divides the belt into two distinct north and south segments. In the northern segment two main structural zones with meridian distribution have been recognized: the foreland fold and thust belt and the metamorphic core. Regional fault systems separate each of these zones. The outer foreland borders the São Francisco Craton. It contains the cratonic cover (Bambuí Group) and the mid Proterozoic Paranoá Group. Shortening of such cover is almost always balanced by top - basement detachments and also by NE trending wrench faults north of parallel 14. The inner foreland consists of the mid Proterozoic Araí, Canastra and Paranoá metasediments. In the northern portion of the inner foreland, shortening is accomodated by basement- involved reverse faults and extensive transcurrent and oblique fault systems. In the southern portion a low angle detachment is proposed to balance shortening of the cover. The outer metamorphic core comprises basement terrains and medium to high grade metamorphic rocks of the Serra da Mesa Group. Two regional fault systems form a complex right-lateral transpressive zone. Shortening of the cover is achieved by asymetric to isoclinal folds and ductile faults. Basement rocks are intirely involved in various thrust slices and deformation is of polyphase character. Different from the described transpressive systems in the literature, the transpressive zone in the outer metamorphic core affects basement and medium grade metamorphic units and the main faults are not vertical thus indicating a transpressive zone in its root. Regional structural analysis at the outer metamorphic core in the northern segment of the belt as well as at the Pirineus bending has detected strain partitioning. From an axis along the bending to the north, slight right-lateral oblique movements give rise to intirely right-lateral wrench faults and finally to slight oblique right-lateral thrusts. This pattern of strain partioning is also detected south of the bending and is equivalent to the northen one except for the sense which is left lateral. According to current models in the literature the arcuate form of the fold and thrust belts is ascribed to collisions with obstacles in the foreland, interaction of the belt with strike slip-faults and collisions with indentors of finite along-strike length. The decreasing effects of the bending towards the foreland and the absence of regional strike -slip faults along the Pirineus bending exclude the first two hypotheses. The third leads to the development of an nonrotational arc. This arc would be due to the collision with and indentor with an wedge - shape, concave-to-the foreland, the same shape of the negative Bouger anomaly along the Rio Maranhão system. By decoupling the maximum compression axis and considering the nonrotational arc hyphothesis, the Brasília Belt thus represents a transpressional orogen in which the contractional component dominates the strike-slip one.