UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA /INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

TESE DE DOUTORADO No 15

RENATO DE MORAES

CONDIÇÕES E EVOLUÇÃO DO METAMORFISMO NO COMPLEXO BARRO ALTO E LITOGEOQUÍMICA DO VULCANISMO BIMODAL DA SEQUÊNCIA JUSCELÂNDIA, GOIANÉSIA GOIÁS
DATA DA DEFESA: 12/09/97
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: GEOLOGIA REGIONAL
ORIENTADOR: PROF. REINHARDT A. FUCK (UnB)
EXAMINADORES: PROF. ARIPLÍNIO ANTÔNIO NILSON (UnB)
PROF. CÉSAR FONSECA FERREIRA FILHO (UnB)
PROF. ASIT CHOUDURI (UNICAMP)
PROF. RUDOLPH A. J. TROUW (UFRJ)

RESUMO

O Complexo Barro Alto, localizado na porção centro - norte de Goiás, faz parte do Cinturão Granulítico Goiano. Seu limite oeste-noroeste é definido pela seqüência vulcanossedimentar Juscelândia. Suas rochas apresentam-se metamorfizadas sob as condições da fácies granulito e as da seqüência Juscelândia na fácies anfibolito.

O Complexo Barro Alto é formado pelas seqüências Serra de Santa Bárbara e Serra da Malacacheta. A primeira é composta principalmente de granulitos máficos, oriundos do metamorfismo de gabronorito, norito, piroxenito e peridotito, limitaos ao norte por uma faixa de silimanita-granada quartzito. Granulitos félsicos estão presentes na forma de lentes de extensão quilométrica e sua composição varia de quartzo diorítica a granodiorítica; alguns dos granulitos félsicos são aluminosos, apresentando associações formadas por cordierita, espinélio, quartzo, granada, silimanita, feldspato e ortopiroxênio. Na área estudada, a seqüência Serra da Malacacheta é constituída pelo anfibolito Cafelândia e uma lente de granulito félsico, petrograficamente similar aos encontrados na seqüência sotoposta.

A seqüência Juscelândia compreende anfibolitos, gnaisses, xistos feldspáticos, xistos pelíticos, metachertes e raras rochas calcissilicáticas. As relações de campo e as feições petrográficas indicam que os anfibolitos são o produto do metamorfismo de rochas vulcânicas e hipoabissais e, em conjunto com os gnaisses e xistos feldspáticos, formam uma suite vulcânica bimodal.

Os anfibolitos da porção inferior a intermediária da seqüência Juscelândia apresentam enriquecimento em LILE, ETRl e concentrações algo elevadas de HFSE; são pobres em Ni e Cr e nos diagramas multielementares normalizados a condrito apresentam anomalias negativas de Sr, P, Ba, Ta e Nb. As suas características geoquímicas são similares às dos basaltos de derrames de platô ou de riftes continentais. Os anfibolitos da porção superior são empobrecidos em ETRl e apresentam padrão similar ao dos basaltos oceânicos tipo N-MORB em diagramas multielementares normalizados a condrito. As rochas félsicas da seqüência Juscelândia são oriundas do metamorfismo de riolitos, riodacitos e granitos subvulcânicos e apresentam padrões em diagramas multielementares normalizados a condrito e a ORG semelhantes aos dos granitos formados em riftes continentais. Essas características geoquímicas sugerem que o vulcanismo reconhecido na seqüência Juscelândia se deu em um rifte continental que possivelmente chegou a evoluir até a abertura de um oceano.

As rochas da seqüência Juscelândia foram metamorfizadas sob as condições da fácies anfibolito, tendo o auge do metamorfismo sido alcançado na zona da silimanita, em torno de 610 oC e 5,5 kbar. As condições de P e T foram determinadas com o programa Thermocalc, sendo os valores de pressão compatíveis com os calculados pelo geobarômetro plagioclásio-granada-quartzo-silimanita. A temperatura calculada pelo geotermômetro granada-biotita forneceu valores de 100 a 150 oC mais baixos. As relações texturais indicam que as rochas foram metamorfizadas seguindo uma trajetória horária na litosfera, atravessando as zonas da estaurolita, cianita e silimanita, quando foram alçadas para porções mais rasas da crosta, compatíveis com as condições da zona da cordierita.

O anfibolito Cafelândia apresenta paragêneses da fácies granulito, tais como ortopiroxênio + clinopiroxênio + plagioclásio + hornblenda ou clinopiroxênio + granada + quartzo + plagioclásio + hornblenda, esta característica de pressões elevadas. Os cálculos termobarométricos efetuados com o programa Thermocalc, com o geotermômetro granada-clinopiroxênio e com o geobarômetro granada-clinopiroxênio-quartzo-plagioclásio fornecem valores similares de P e T, indicando que o pico do metamorfismo ocorreu em torno de 750 50 oC e 8,0 0,5 kbar. No entanto, a presença de mobilizados quartzo-feldspáticos associados ao anfibolito revela que essas são condições mínimas para o pico do metamorfismo, visto que resultados experimentais de fusão de quartzo anfibolito sugerem temperatura de 880 oC para uma pressão de 8 kbar.

Os cálculos termobarométricos para os granulitos foram feitos com o programa Thermocalc, sendo também utilizado o geobarômetro granada-ortopiroxênio-quartzo-plagioclásio nos granulitos félsicos e os geotermômetros granada-clinopiroxênio e granada-ortopiroxênio nos granulitos máficos. Os resultados com as maiores barras de erro ou com as menores temperaturas calculadas foram obtidos nos granulitos máficos, com valores entre 680 e 750 75 oC e 8,3 e 10,5 1,3 kbar. Os menores valores de T foram obtidos com o geotermômetro granada-ortopiroxênio.

Nos granulitos félsicos, os cálculos de T e P feitos com o programa Thermocalc indicaram valores variando entre 755 55 oC e 934 102 oC e 6,8 0,9 e 8,5 1,2 kbar. O geobarômetro granada-ortopiroxênio-quartzo-plagioclásio forneceu valores de P similares.

As paragêneses dos granulitos aluminosos indicam que as condições de P e T calculadas para os granulitos félsicos devem ser mínimas, pois a associação espinélio + quartzo cordierita só cristaliza sob condições de temperaturas e/ou pressões elevadas (> 900 oC e 8,5 kbar). Sua substituição por ortopiroxênio + silimanita granada ou granada + silimanita parece ter ocorrido em torno do ponto invariante da safirina, estável sob condições de alta fugacidade de oxigênio, seguindo uma trajetória de resfriamento isobárico.

A comparação entre os valores de P e T calculados e as trajetórias PT sugeridas para as rochas da seqüência Juscelândia e do Complexo Barro Alto indica que houve a supressão de parte da coluna geológica da região.

A colisão entre dois blocos continentais (Maciço Goiás e Placa São Franciscana) seguida de afinamento crustal é a situação geológica favorável para a formação das trajetórias PT sugeridas para as rochas da seqüência Juscelândia e do Complexo Barro Alto. A supressão de parte da coluna geológica teria ocorrido durante a estruturação final da Faixa Brasília, quando se deu o soerguimento das rochas do complexo e da seqüência vulcanossedimentar.


  
 
UNIVERSITY OF BRASILIA / INSTITUTE OF GEOSCIENCES

PhD THESIS No 15

RENATO DE MORAES

CONDITIONS AND EVOLUTION OF THE METAMORFISM IN THE BARRO ALTO COMPLEX AND LITHOGEOCHEMISTRY OF THE BIMODAL VOLCANISM FROM THE JUSCELÂNDIA SEQUENCE,GOIANÉSIA GOIÁS
DATE OF ORAL PRESENTATION: 12/09/97
TOPIC OF THE THESIS: REGIONAL GEOLOGY
SUPERVISOR: PROF. REINHARDT A. FUCK (UnB)
COMMITTEE MEMBERS: PROF. ARIPLÍNIO ANTÔNIO NILSON (UnB)
PROF. CÉSAR FONSECA FERREIRA FILHO (UnB)
PROF. ASIT CHOUDURI (UNICAMP)
PROF. RUDOLPH A. J. TROUW (UFRJ)

ABSTRACT

The Barro Alto Complex, situated in the centre-north portion of Goiás state, is part of the Goiano Granulite Belt. Its west-northwest border is defined by the Juscelândia volcano-sedimentary sequence. The rocks of the Barro Alto Complex were metamorphosed under granulite facies conditions and those of the Juscelândia sequence under amphibolite facies conditions.

The Barro Alto Complex is formed by Serra de Santa Bárbara and Serra da Malacacheta sequences. The former consists mainly of mafic granulites, resulting from the metamorphism of gabbronorite, norite, piroxenite and peridotite. They are limited, in the north, by a sillimanite-garnet quartzite. Felsic granulites are present in lenses, which may extend for kilometers. Their composition varies from quartz diorite to granodiorite. Some of the granulites are aluminous and show assemblages formed by cordierite, spinel, quartz, garnet, sillimanite, feldspar and orthopyroxene. In the area studied, the Serra da Malacacheta sequence consists of the Cafelândia amphibolite and a lens of felsic granulite, petrographically similar to those of the Serra de Santa Bárbara.

The Juscelândia sequence is made up of amphibolite, gneisses, feldspathic schists, pelitic schists, metacherts and calcsilicate rocks. The field relationships and petrographic features indicate that the amphibolites are the metamorphic product of volcanic and hipoabissal rocks and, together with the gneisses and feldspathic schists, form a bimodal volcanic suite.

The amphibolites of the lower to intermediate portion of the Juscelândia sequence are enriched with LILE, light REE and somewhat elevated concentrations of HFSE; they are poor in Ni and Cr. Chondrite normalised spidergrams of these rocks indicate negative anomalies of Sr, P, Ba, Ta and Nb. Their geochemical characteristics are similar to the continental rift or plateau basalts. The amphibolites of the lower portion are depleted in light REE and show a pattern similar to the oceanic N-MORB basalts in their chondrite normalised spidergrams. The felsic rocks of the Juscelândia sequence are the result of metamorphism of riolites, riodacites and subvolcanic granite and their patterns in chondrite or ORG normalised spider diagrams are similar to that of continental rift granites. These geochemical characteristics suggest that the volcanism of the Juscelândia sequence took place in a continental rift that possibly evolved from the opening of an ocean basin.

The rocks of the Juscelândia sequence were metamorphosed under amphibolite facies conditions, the peak metamorphism reaching the sillimanite zone, at 600 oC and 5.5 kbar. The P and T conditions were determined with Thermocalc. The P values are compatible with those calculated by the plagioclase-garnet-sillimanite-quartz geobarometer. The temperatures calculated by the garnet-biotite geothermometer are 100 to 150 oC lower than those from Thermocalc. The textural relationships indicate that the rocks follow a clockwise PT path during metamorphism, crossing the staurolite, kyanite and sillimanite zones. Afterwards they entered lower crustal levels, compatible with the cordierite zone.

The Cafelândia amphibolite shows granulite facies assemblages, as orthopyroxene + clinopyroxene + plagioclase + hornblende or clinopyroxene + quartz + garnet + plagioclase + hornblende, the latter being characteristic of high pressures. The thermobarometric calculations, obtained using Thermocalc, a garnet-clinopyroxene geothermometer and a garnet-clinopyroxene-quartz-plagioclase geobarometer, all of which show similar values for P and T, and indicate that the metamorphic peak occured around 750 ± 50 oC and 8.0 ± 0.5 kbar. However, the presence of quartz-feldspathic leucossomes associated with amphibolite reveal that these are the minimal conditions during the metamorphic peak, inasmuch as the experimental melting of quartz amphibolite suggests a temperature of 880 oC for a pressure of 8 kbar.

The thermobarometric calculations for the granulites were obtained with Thermocalc, the garnet-orthopyroxene-quartz-plagioclase geobarometer being used with the felsic granulites and the garnet-clinopyroxene and garnet-orthopyroxene geothemometers with the mafic granulites. The lower temperatures and the major errors bars were obtained with mafic granulites, with values ranging from 680 to 750 ± 75 oC and 8.3 and 10.5 ± 1.3 kbar. The lowest T values where obtained with the garnet-orthopyroxene geothermometer.

In the felsis granulites, the P and T calculations made with Thermocalc indicate values varying between 755 ± 55 oC and 934 ± 102 oC and 6.8 ± 0.9 and 8.5 ± 1.2 kbar. The garnet-orthopyroxene-quartz-plagioclase geobarometer supplies similar P values.

The aluminous granulites parageneses indicate that the P and T condition calculated for felsic granulites should be minimal, since the assemblage spinel + quartz ± cordierite crystallized only at very high temperatures and/or pressures (> 900 oC and 8.5 kbar). Its substitution by orthopyroxene + sillimanite ± garnet or sillimanite + garnet seems to have occurred around the sapphirine invariant point, which is only stable at high oxygen fugacity conditions, following an isobaric cooling path.

The comparison between the P and T values calculated and the suggested PT path for the rocks of the Juscelândia sequence and the Barro Alto Complex, indicates that part of the geologic column of the region was suppressed.

The collision between two continental blocks (Goiás Massif and the São Francisco Plate) followed by crustal thinning is a favourable geological situation for the formation of the suggested PT paths for both rock groups. The suppression of part of the geologic column occurred during the final structuration of the Brasília Fold Belt, when the unroofing of the Barro Alto Complex and Juscelândia sequence rocks occurred.