UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA /INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
TESE DE DOUTORADO No
21
JÉSSICA BEATRIZ CARVALHO
PETROLOGIA DE XENÓLITOS MANTÉLICOS DA PROVÍNCIA DO ALTO PARANAÍBA, MINAS GERAISDATA DA DEFESA: 19/12/97
RESUMO
Xenólitos mantélicos hospedados em rochas vulcânicas potássicas intracontinentais correspondem às amostras de derivação mais profunda de que se dispõe. São bem preservados de reações retrometamórficas ou qualquer tipo de alteração não-mantélica, e seu estudo permite a caracterização direta de diversas particularidades do manto litosférico continental que foi amostrado como: sua profundidade, estado térmico e composição, e processos envolvidos em modificações destas características ao longo da sua evolução temporal. Uma das principais conseqüências desta caracterização repousa na avaliação do potencial diamantífero da região.
Neste trabalho estão apresentados dados e interpretações relativos a uma coleção de cerca de 80 xenólitos mantélicos (além de amostras menores). As amostras foram extraídas de seis intrusões "kimberlíticas", "lamproíticas" e "kamafugíticas" constituintes da Província Magmática do Alto Paranaíba (PAP), no sul de Goiás e oeste de Minas Gerais. Esta província é particularmente interessante para o desenvolvimento de uma pesquisa com xenólitos mantélicos, devido à complexidade do seu magmatismo e relevância acadêmica do seu estudo, bem como por ser alvo de controvérsia a respeito da origem do diamante aluvionar no oeste mineiro.
Devido ao pequeno tamanho das amostras obtidas, a pesquisa foi baseada em levantamento das texturas e química de elementos maiores dos minerais essenciais, especificamente: granada, olivina, piroxênios, flogopita, espinélios, ilmenita e anfibólios. Os principais tipos de rochas encontrados são granada peridotitos, espinélio peridotitos (com ou sem anfibólio primário), cromita-flogopita harzburgito (harzburgito a duas fases, com Cr-Al enstatita), rochas magmáticas equivalentes à suíte MARID, e amostras com infiltrações metassomáticas ou de alguma forma associadas a metassomatismo. Cada grupo, que pode ainda incluir subgrupos químicos, apresenta particularidades genéticas que foram individualmente exploradas, e um modelo estratigráfico integrado foi elaborado.
O manto litosférico sob a região da PAP apresentava, no Cretáceo, estado térmico compatível com um fluxo calórico superficial de 36mW/m2, estando química e termalmente bem preservado até pelo menos a profundidade de aproximadamente 190km. O evento termal relacionado à magmagênese do Cretáceo, em outros trabalhos associado a uma pluma mantélica, alterou o estado de equilíbrio térmico e químico do manto. Os processos envolvidos ocorreram em um lapso de tempo extremamente curto e próximo à captura dos xenólitos pela hospedeira. Tais processos foram rastreados até a profundidade acima referida, e incluem: (a) aquecimento a T > 1100-1300oC; (b) deformação (formação de neoblastos de olivina); (c) aumento da fO2 de ~FMQ para FMQ+2 ou FMQ+3. Outras feições químicas e texturais estão também envolvidas, como queda do alumínio e aumento de Fe-Ti-K em rocha total nos granada peridotitos, com decomposição de granadas, alteração química ou transformação de piroxênios e neocristalização de flogopita, potássio richterita e, eventualmente, ilmenita. Foi aqui encontrada uma nova substituição para richteritas, com solução-sólida extensiva, a alta temperatura, com cummingtonita. O evento termal e metassomático pode ter sido também responsável pela mobilização local de cromo, em situações de temperatura e fO2 ultra elevadas, bem como pela geração de líquidos associados à suíte MARID. A alteração ocorreu de forma espacialmente heterogênea, isto é, algumas porções do manto foram profundamente afetadas, enquanto outras permaneceram bem preservadas, não havendo qualquer variação sistemática com a profundidade. Nas rochas mais preservadas ocorrem as mesmas feições observadas nas rochas mais alteradas, porém em uma escala submilimétrica. Propõem-se que migração de um fluido superaquecido ao longo de limites de grãos, ou canais formados pela própria deformação das rochas, seja o mecanismo associado à alteração.
O fluxo calórico original e a profundidade do manto litosférico preservado são perfeitamente compatíveis com um ambiente cratônico normal. No entanto, em termos de composição de rocha total os peridotitos mantélicos originais da PAP, tanto no fácies granada quanto espinélio e previamente à alteração metassomática do Cretáceo, são mais ricos em componentes basálticos que alguns ambientes cratônicos típicos como os crátons do Kaapvaal ou siberiano, mas encontra similaridade em regiões específicas como a Austrália ou Tanzânia. O padrão de alteração metassomática (cretácico) encontrado nas rochas da PAP também é coerente com aquele de áreas cratônicas, muito embora não tenha sido detectado o ponto de inflexão da geoterma cratônica em profundidade. Este ponto corresponde à região na qual o manto está homogeneamente afetado pelo evento metassomático.
A PAP apresenta elevado potencial para diamante primário, hospedado nas rochas "kimberlíticas". Esta afirmação está baseada: (a) no ambiente cratônico definido para a região, (b) na heterogeneidade espacial da impressão metassomática do Cretáceo, provavelmente associada a destruição do diamante, (c) na derivação profunda de pelo menos parte dos magmas, dentro da zona do diamante. Sugere-se que o potencial prospectivo seja limitado às zonas mais a oeste da província (distantes do rift da Mata da Corda) e/ou magmas mais antigos da província, bem como a pipes que não apresentem sintomas de diferenciação magmática (como Indaiá II, aqui definido como diferenciado de Indaiá I). Ainda, dado o carácter relativamente fértil do manto, a utilização de critérios prospectivos baseados na existência de assinatura harzburgítica no "fácies diamante", como presença de granadas G10, provavelmente levará a resultados equivocados.
UNIVERSITY OF BRASILIA / INSTITUTE OF GEOSCIENCES
PhD THESIS No
21
JÉSSICA BEATRIZ CARVALHO
PETROLOGY OF THE MANTELIC XENOLITHS FROM THE ALTO PARANAÍBA PROVINCE, MINAS GERAIS STATEDATE OF ORAL PRESENTATION: 19/12/97
ABSTRACT
Mantle xenoliths brought to the surface by intracontinental potassic volcanic rocks are the deepest and best preserved samples from the lithospheric continental mantle. Their chemical characterization provides information about the depth and thermal conditions of the mantle, as well as about the processes involved with modifications of these features during its temporal evolution. One of the most important consequences of this study is the evaluation of the diamond potential of a particular region.
Here we present textural and chemical data of about 80 mantle xenoliths collected from six different pipes from the Alto Paranaíba Igneous Province (APIP), southeastern Brazil. This province is particularly interesting for such a research because of the high complexity of its "kimberlitic", "lamproitic" and "kamafugitic" magmas, and the undefined origin of the diamond present in many alluvial deposits in the region. The xenoliths are normally small, and this research is focused in their textures and major element mineral chemistry of garnet, olivine, pyroxenes, phlogopite, amphibole, spinels and ilmenite. The main rock types observed are garnet peridotites, spinel peridotites sometimes with primary amphibole, two-phase harzburgite with Cr-Al enstatite (and chromite, phlogopite), igneous rocks equivalent to the MARID suite, and other metasomatism-related samples. Each rock type may be further subdivided into different chemical groups with particular genetic characteristics.
The continental lithospheric mantle beneath the Alto Paranaíba Igneous Province had a Cretacic geotherm equivalent to a surface caloric flux of 36mW/m2, and a depth of at least 190km. The Cretaceous thermal event responsible for the generation of the APIP magmas is related to a mantle plume imprint, which promoted strong perturbation of the previous thermal and chemical state of the mantle in a very short time before the xenoliths were brought to the surface. The processes involved with this perturbation are mainly: (a) heating around T > 1100-1300oC; (b) deformation, with formation of olivine neoblasts and pyroxene alteration; (c) increase of the fO2, from ~FMQ to FMQ+2 or +3. Other chemical features related to the same event are bulk rock aluminum depletion and increase in Fe-Ti-K, after garnet decomposition, pyroxene alteration and crystallization of phlogopite, potassium richterite, and eventually ilmenite. We have also observed a new substitution for the potassium richterite, with extensive solid-solution with cummingtonite under very high temperature. The thermal and metasomatic imprint is still responsible for local chromium mobilization under ultra-high temperature and fO2 conditions, and for the generation of MARID-related magmas and secondary fluids.
There is no systematic depth variation for the thermal and metasomatic alteration of the mantle peridotites. In similar depth intervals it is possible to observe both well preserved, coarse and cold peridotites, and very modified hot peridotites. The same chemical patterns is noted in both types of peridotites, although in the best preserved rocks the chemical alteration occurs in a submillimetric scale, while at least in a centimetric scale in the most modified rocks. We suggest as a likely mechanism the migration of a very hot metasomatic fluid along grain boundaries or channels through the lithospheric mantle.
The calculated original geotherm and the depth of the lithospheric mantle underlying the APIP region are characteristic of a normal cratonic mantle. However, the bulk rock composition of APIP peridotites in the garnet or spinel mantle facies is richer in basaltic elements than typical cratonic regions such as the Kaapvaal or Siberian Cratons. Its composition is more similar to particular regions like Australia and Tanzania. The chemical pattern for the Cretaceous mantle modification is similar to that from other cratonic regions, but we did not identified an inflection in the cratonic geotherm, or the depth where the rocks are homogeneously modified by the Cretaceous metasomatic imprint.
The APIP diamond potential is high, for the following reasons: (a) the magmas were generated in a cratonic mantle, despite the surface tectonic setting of a Upper Proterozoic mobile belt; (b) the lateral and vertically heterogeneous imprint of the Cretaceous metasomatic and thermal event must be related to diamond survival during this event; (c) some of the "kimberlitic" magmas were derived from the diamond mantle facies and the "diamond window" is present. We suggest that the diamond potencial is limited to the pipes in the western portion of the province or to the older intrusions, as well as to primitive magmas which were not submitted to fractional crystallization. The relative fertile chemical character of the APIP mantle inhibit the direct application of traditional prospective criteria based on the presence of a very depleted harzburgitic chemical signature, such as revealed by G10 garnets.