Capítulo 2

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2.1. Geologia regional : a Faixa de Dobramentos Brasília.

A região de Araxá faz parte do setor meridional da Faixa de Dobramentos Brasília, setor oriental da Província Estrutural Tocantins (Almeida et al., 1977), um cinturão orogênico que se desenvolveu na borda oeste do Cráton do São Francisco durante o neoproterozóico (figuras 2.1 e 2.2).

Figura 2.1. Províncias Estruturais Brasileiras (Almeida et al., 1977). No detalhe está representada parte da região meridional da Faixa de Dobramentos Brasília, onde se insere a área de enfoque deste trabalho. Reproduzido do Mapa Geológico do Brasil de Schobbenhaus et al. (1984), na escala 1:2500000. PMax = Grupo Araxá; PMca = Grupo Canastra; PSi = Grupo Ibiá.

Figura 2.2. Setor meridional da Faixa Brasília no Estado de Minas Gerais ( Extraido do Mapa Geológico de Minas Gerais, Soares et al., 1994). Al-colúvios; TQ-coberturas detríticas/lateríticas/ eluvionares / Grupo Mata da Corda = MC-Form. Capacete; MCP- Form. Patos / Gr. Areado = AE-;/ Gr. Bauru = BU / SG-Form. Serra Geral; BT-Form. Botucatu; AQU-Form. Aquidauana /Gr. Bambuí = BTM-Form. Três Marias ; BBS-Form. Serra da Saudade; BSH-Form. Serra de Santa Helena; BSL-Form.Sete Lagoas; JE-Form. Jequitaí (SA-Diamictitos Samburá) / BP- Subgrupo Paraopeba indiviso / Gr. Ibiá = IBF- Form. Rio Verde; IBD-Form. Cubatão (diamictitos)/ Gr. Araxá = ARX-micaxistos; ARG1-gnaisses, xistos, quartzitos, anfibolitos,metaultrabasitos, metafelsitos; ARG2-anfibolitos/ Gr. Andrelândia = AQ-domínio de quartzitos / CR-Form. Carmo do rio Claro/ PAF-Form.Paracatu / VAA-Form.Vazante-ardósias, fosforitos,quartzitos; VAD-Form. Vazante- dolomitos / Gr. Canastra = CAQ- quartzitos; CAX- filitos e xistos / FM-Seq. Vulcano-sedimentar de Fortaleza de Minas / PH- Seq. Vulcano-sedimentar de Pium-Hi / BI- Complexo Barbacena / BG- Granitos a quartzodioritos / CG-Complexo Campos Gerais / VC –Complexo Varginha/ CAC-Grupo Caconde/ g - granitos tardi a pós-tectônicos; g 1 – granada granitóides. O retângulo indica a região mapeada. Zonas de cisalhamento transcorrentes: 1- Campos Altos- Lagoa da Prata; 2- Doresópolis – Pains; 3 – Tapira – Candeias; 4 – Bocaina (ou Pirapetinga).

Na presente síntese utiliza-se a expressão simplificada "Faixa Brasília" no sentido de Fuck (1994). A expressão original "geossinclíneo Brasília" surge na revisão elaborada por Almeida (1967), significando uma faixa de metassedimentos que evoluiu à borda ocidental da plataforma do São Francisco como um miogeossinclíneo, durante o Proterozóico Superior, representado pelos Grupos Canastra (Barbosa, 1963) e Bambui (Branco e Costa, 1961). As rochas do Grupo Araxá (Barbosa, 1955) foram interpretadas por aquele autor como eugeossinclinais e pertencentes "pelo menos a um ciclo tecto-orogênico pré-Baykaliano", denominado Ciclo Uruaçuano. Esta concepção incluia os terrenos granito-greenstone, atualmente individualizados, e serviu como base para a proposta de compartimentação tectônica nas Faixas de Dobramentos Brasília e Uruaçu e no Maciço Mediano de Goiás (Almeida et al., 1976, 1977). Estas idéias foram compartilhadas por Marini et al. (1978), Marini et al. (1979), Fuck e Marini (1979), Marini et al. (1984a) e Marini et al. (1984b), embora com novos enfoques segundo a teoria da Tectônica Global. Segundo estes úlimos autores a Faixa de dobramentos Uruaçu compreende "metassedimentos relacionados ao Proterozóico Médio, dobrados e metamorfizados até a facies anfibolito durante o Evento Uruaçuano (entre 1200 e 1100 Ma)" e que a Faixa de Dobramentos Brasília "é constituida por metassedimentos do Proterozóico Superior, metamorfizados desde incipientemente até o facies xisto verde, sendo metamorfismo e deformação gradativamente menos intensos de oeste para leste, onde transiciona para os sedimentos de cobertura do Cráton do São Francisco", tendo evoluido durante o Ciclo Brasiliano, com deformação e metamorfismo em torno de 600 Ma.

Concomitantemente, outros autores ( Costa et al., 1970, Costa e Angeiras ,1971, Leonardos e Fyfe, 1974, Pena et al., 1975 e Dardenne, 1978 e 1979) interpretavam a evolução do geossinclíneo Brasília no âmbito de um único ciclo geotectônico. Embora as idéias de Almeida (1977) tenham dominado o cenário das interpretações geotectônicas da região centro-oeste do Brasil durante a década de 70 e início da década de 80, as propostas que contemplam a evolução em um único ciclo tectônico, num contexto de Tectônica Global, têm sido reforçadas por pesquisas recentes ( Leonardos et al., 1990; Brod et al., 1991; Brod et al., 1992; Fuck, 1990, 1994; Fuck et al., 1993, 1994; Trow et al., 1994; Alkimim et al., 1993; Suita e Chemale Jr., 1995; Ribeiro, 1994; Pimentel et al., 1992, Fonseca e Dardenne, 1996, Fonseca, 1996, Strieder e Nilson, 1992 e 1994; Strieder, 1993; Freitas-Silva, 1996), mas adquiriram nova expressão com o modelo de acresção de arcos vulcânicos intraoceânicos e o registro de pelo menos duas colisões continentais (Pimentel et al., 1999).

Brod et al. (1991) propõem um modelo geotectônico baseado na Tectônica de Placas para a região de Abadia dos Dourados-Monte Carmelo onde ocorrem rochas ligadas ao Grupo Araxá e Grupo Ibiá. O ciclo Brasiliano teria se iniciado por rifteamento de crosta continental (complexo granito-gnáissico) com geração de assoalho oceânico (metagabros e anfibolitos) e sedimentação abissal (metapelitos e metachert) acompanhada de vulcanismo básico e ácido. Segundo aqueles autores a subducção do assoalho oceânico teria ocorrido de leste para oeste sob o Cráton Paraná e o ciclo teria se fechado com colisão continental que teria estruturado a região em diversas escamas tectônicas superpostas, onde o metamorfismo aumenta de leste para oeste.

Strieder e Nilson (1992) propõem a existência de sutura crustal na região de Abadiânia, caracterizada por associações petrotectônicas de serpentinitos com cromita podiforme e corpos máficos tectonicamente encaixados em metassedimentos relacionados ao Grupo Araxá e localizados junto a uma anomalia gravimétrica expressiva (anomalia tipo I - Hasui e Haralyi, 1985) ( fig. 4 e 5). Os mesmos autores interpretam a inflexão dos Pireneus como uma sintaxe tectônica provavelmente desenvolvida pelo underthrusting de uma placa continental com formato de cunha, durante o Proterozóico Superior, e entendem que a evolução das faixas Uruaçú e Brasília deu-se durante um único ciclo tectônico.

Alkmim et al. (1993) em síntese sobre a evolução do Cráton São Francisco destacam que este teria sido fragmentado em torno de 1,7 G.a., com base em vulcanismo ácido datado pelo método U-Pb e a partir dai, teriam evoluido diversas bacias , de modo diacrônico e encerrando longa história de ensialidade. As grandes inversões teriam ocorrido durante o Evento Brasiliano estruturando as faixas marginais, entre elas a Faixa Brasília, que teria materiais oceânicos brasilianos representados pelos complexos de subducção e mèlanges ofiolíticas (Drake Jr., 1980, Strieder, 1990, Strieder e Nilson, 1992) e remanescentes de arcos insulares gerados em torno de 900 M.a. no Maciço Goiano (Pimentel e Fuck, 1992).

Strieder (1993) elabora revisão sobre os modelos geotectônicos desenvolvidos para a Faixa Brasília discutindo as bases conceituais empregadas, desde a visão Geossinclinal, passando pela hipótese dos Cinturões Móveis, até os modelos de Tectônica Global, assinalando que "Ao contrário do que se tem afirmado (precariedade dos mapeamentos geológico-estruturais e das datações específicas), parece que não houve, na realidade, uma mudança de concepção tectônica capaz de redirecionar os trabalhos geológicos e salientar feições estruturais até então negligenciadas", referindo-se à quase inexistência de trabalhos que apliquem os conceitos de Tectônica Global como a caracterização de estruturas típicas de regiões de convergência crustal, a exemplo das lâminas de cavalgamento e distinção de terrenos autóctones e alóctones. Na região de Santa Cruz de Goiás Strieder (1993) caracterizou duas unidades litológicas, uma gnáissica e outra metassedimentar, a primeira composta de granitos peraluminosos similares a granitos colisionais e com idade de formação de 794 ± 10 M.a. (Pimentel et al., 1992), e que indicam idade máxima para a colisão continental na região. A unidade metassedimentar é constituida por xistos Araxá e por blocos tectônicos derivados de fragmentação de complexos ofiolíticos, e portanto correlacionável à mèlange ofiolítica de Abadiânia (Strieder, 1989).

Na síntese regional elaborada por Fuck (1994), a Faixa Brasília é apresentada como um "extenso sistema de dobramentos neoproterozóicos, edificado na margem oeste do Cráton do São Francisco" e compartimentado em zonas cratônica , zona externa e zona interna. A zona cratônica é constituida por exposições do embasamento cobertas pelas sequências sedimentares proterozóicas dos Grupos Paranoá e Bambuí. A zona externa é representada pelas sequências metassedimentares dos Grupos Paranoá e Canastra e pelas Formações Vazante e Ibiá, além de porções de seu embasamento. A zona interna compreende os micaxistos e as rochas do Grupo Araxá e áreas de embasamento expostas entre os xistos. O mesmo autor ainda destaca a presença do arco magmático do oeste de Goiás, com caráter intraoceânico, de idade neoproterozóica e cuja relação com a Faixa Brasília ainda é pouco conhecida e o microcontinente do centro de Goiás, que compreende um "fragmento crustal complexo" onde ocorrem os terrenos granito-greenstone formados no Arqueano. Valeriano et al. (1994) concordam com o modelo de compartimentação tectônica de Fuck (1994), e acrescentam que "... este zoneamento apresenta-se truncado e deslocado por zonas de transferência transcorrentes (rampas laterais) que tiveram um papel de acomodação entre segmentos transversais com diferentes taxas de deslocamento" e comentam que algumas destas zonas se desenvolveram a ponto de dificultar a correlação dos domínios longitudinais e unidades litoestratigráficas em segmentos transversais adjacentes.

Suita e Chemale Jr. (1995) elaboram revisão dos estudos mais recentes com relação à evolução das províncias São Francisco e Tocantins e sugerem que o chamado "Ciclo Uruaçuano" não representaria uma orogênese, e sim um evento magmático-hidrotermal local, e que a deformação e o metamorfismo das associações petrotectônicas da Província Tocantins teriam ocorrido durante a Orogenia Brasiliana entre 590 e 930 M.a. Estas conclusões estão apoiadas em dados geocronológicos divulgados em diversos trabalhos como os de Pimentel (1991) , Pimentel et al. (1992), Pimentel et al. (1993), Ferreira Filho et al. (1994) e Suita et al. (1994). Estes autores e Nilson et al. (1994) desenvolvem modelos de evolução para a região centro-oeste que sugerem um evento de rifteamento em crosta continental com intrusão de magma basáltico em níveis subcrustais de idade Paleo a Mesoproterozóica (1,78 G.a -1,58 G.a - originando os complexos máfico-ultramáficos acamadados de Niquelândia, Barro Alto e Cana Brava), um evento magmático localizado no Complexo Barro Alto a 1,29 G.a.-1,35 G.a. e por fim um evento de colisão continental a 0,77-0,82 G.a. responsável pelo metamorfismo regional que alcançou o fácies granulito. Winge (1995) defende hipótese de evolução tectono-magmática complexa para os terrenos granulíticos, "levando à oceanização, mesmo que limitada, em continuidade à tectônica de rift Araí/Araxá há cerca de 1,8 G.a." e considera a granulitização "ligada a evento extensional brasiliano". D’el-Rey Silva et al. (1997) estudando o Complexo de Barro Alto, propõem três eventos de deformação dúctil e progressiva sob condições termais compatíveis com o soerguimento com o tempo, variando de granulito (acompanhada de foliação S1) para anfibolito (acompanhada de foliação milonítica S2) e por fim xisto verde (acompanhada de foliação plano axial S3), e sugerem um contexto de "underthrusting" de leste para oeste. Em contrapartida, Moraes e Fuck (1997) através de estudos metamórficos nos granulitos de Barro Alto, concluem que aquelas rochas, metamorfoseadas para fácies granulito durante colisão continental entre 0,77 e 0,82 Ga, sofreram um resfriamento importante, implicando em residência crustal longa, antes de serem soerguidas na crosta e deste modo sugerem que seu soerguimento está relacionado com outro evento tectônico. Estes dados colocam em evidência uma possível evolução tectônica mais complexa para a Faixa Brasília.

Fonseca (1996) e Fonseca e Dardenne (1996) subdividem o setor setentrional da Faixa Brasília em duas zonas estruturais as quais denominaram de "cinturão de dobras e falhas de antepaís" e "núcleo metamórfico". Segundo estes autores "o antepaís externo bordeja a margem oeste do Cráton do São Francisco" envolvendo a cobertura cratônica representada pelo Grupo Bambuí, "além de pequenas exposições do embasamento". A deformação destas coberturas dá-se através de tectônica epidérmica, com falhas subhorizontais e rampas conectadas e falhas transcorrentes NE e NW ancoradas no embasamento. "O ante-país interno se compartimenta em dois segmentos, norte e sul. Ao norte, por sobre o embasamento, ocorrem as unidades dos Grupos Araí e Paranoá" com envolvimento do embasamento, enquanto o segmento sul envolve principalmente o Grupo Paranoá sem evidências de envolvimento do embasamento. Já o núcleo metamórfico "envolve rochas dos Grupos Araxá e Serra da Mesa, além de terrenos do embasamento sensu strictu, sequências vulcano-sedimentares e de arco (Mara Rosa), além de ortognaisses neoproterozóicos (Pimentel et al., 1995)". Fonseca e Dardenne (1996) retomam e ampliam as idéias de Strieder (1993) propondo que a estruturação da Faixa Brasília deu-se num contexto de "colisão com uma margem irregular, na forma de um indentante que avança em direção ao pós-país" produzindo a partição da deformação a partir da Megainflexão dos Pireneus. Como consequência, configuraram-se sistemas transcorrentes com cinemática sinistral a sul daquela megaestrutura e dextral a norte da mesma. Esta concepção é apoiada por trabalhos de Pimentel et al. (1996) que estudaram a região de Jussara-Goiás-Mossâmedes, sugerindo que o Maciço de Goiás, de idade Arqueano-Paleoproterozóico, constitui a extremidade ocidental do continente neoproterozóico São Francisco / Congo, e teria atuado como uma saliência indentadora durante a colisão entre este continente e o continente Amazônico durante o Neoproterozóico, sugerindo modificação na interpretação anterior de que o Maciço de Goiás seria um microcontinente (Fuck,1994).

Freitas-Silva (1996) admite que o arcabouço estrutural da Faixa Brasília, pode ser explicado através de "um único evento de deformação progressiva que corresponde à progressão da deformação durante a inversão tectônica brasiliana da faixa". Este autor acredita que o padrão geométrico triangular da Faixa Brasília seja feição herdada dos processos de rifteamento crustal que lhe deram origem ao contrário dos modelos que favorecem a atuação de um elemento indentante na altura da Inflexão dos Pireneus durante colisão continental. Com base no estilo da deformação e do metamorfismo e em dados geocronológicos subdivide o evento deformacional brasiliano em três estágios: pré-colisional, sin-colisional e pós-colisional. O mesmo autor sugere com base em remanescentes de arcos magmáticos (Pimentel e Fuck, 1992; Pimentel et al., 1994) e mélanges ofiolíticas (Drake Jr., 1980; Strieder, 1989; Strieder e Nilson, 1992), que o "encurtamento e espessamento tectônico da Faixa Brasília, resultaram, principalmente, de processos de subducção oblíqua tipo B ocorridos durante a fase de inversão principal da Faixa Brasília, com crosta oceânica sendo subductada de leste para oeste", de modo similar ao sugerido por Brod et al. (1991) e Alkmim et al. (1993).

Em revisão recente sobre a Faixa Brasília, Pimentel et al. (1999) sugerem que a mesma evoluiu a partir da acresção de diversos arcos de ilhas intraoceânicos no período de 0,9 a 0,63 Ga. As primeiras manifestações magmáticas nos arcos de Arenópolis e Mara Rosa, geradas pela convergência entre os continentes do Amazonas e do São Francisco, seriam representadas por metatonalitos com idades de 0,85-09 Ga. No setor meridional da Faixa, teria ocorrido colisão entre o continente São Francisco e o Bloco Paraná em torno de 0,79 Ga., idade das manifestações magmáticas ácidas da região de Ipameri e Pires do Rio. Por fim, o último evento colisional teria ocorrido em torno de 0,63 Ga. (idade Brasiliana), interpretada como a colisão entre os continentes do Amazonas e do São Francisco.

2.2. Geologia da região de Araxá e áreas contíguas.

2.2.1. Introdução.

A existência de águas minerais nas proximidades da cidade de Araxá , Minas Gerais, foi o principal motivador de observações geológicas nesta região desde Saint¢ Hilaire(séc. XVIII, apud Barbosa et al.,1970), seguindo-se, segundo Barbosa et al. (1970), Derby (1886), Hussak (1894), Sena (1921), Guimarães,(1925), Barbosa, (1934, 1936, 1937 ) e Campos, (1937 e 1939), além de Andrade Jr. (1925) e Barbosa (1955).

Os complexos alcalinos da região (Barreiro, Tapira, Serra Negra e Salitre) e sua estruturação em domos, só vieram a ser caracterizados entre 1953 e 1954, pela Prospec S.A., para o DNPM, após os estudos sobre a apatita (Guimarães, 1947, apud Barbosa et al., 1970) e a descoberta do pirocloro no Barreiro (Ilchenko & Guimarães, 1954, apud Barbosa et al., 1970) . Estes trabalhos motivaram o primeiro levantamento geológico sistemático da região a partir de 1955, cujos resultados foram divulgados na forma de mapa na escala 1:500000 durante o Congresso da Sociedade Brasileira de Geologia em 1966. O interesse econômico despertado por este levantamento permitiu a continuidade das investigações geológicas na região através do Projeto Chaminés - Geologia da Região do Triângulo Mineiro ( Barbosa et al., 1970), que culminou na publicação dos mapas geológicos das Folhas Catalão, Patos de Minas, Uberaba e Araxá, na escala 1:250000, e no detalhamento da pesquisa mineral junto às ocorrências minerais dos complexos alcalinos. Soares et al. (1994) reúnem os dados geológicos mais recentes que incluem a região de Araxá, no Mapa Geológico de Minas Gerais (figura 2.2 ) que é utilizado como referência para as discussões que se seguem.

Diversas anomalias aeromagnéticas na região SE de Araxá foram objeto de investigação por Paulsen et al. (1974) em continuidade aos trabalhos do Convênio Geofísico Brasil-Alemanha.

A região voltou a ser palco de estudos geológicos por ocasião da implantação da Usina Hidroelétrica de Nova Ponte a norte de Araxá (Ferrari, 1989a, 1989b), e mais recentemente por Simões e Navarro (1996, 1997) e Seer et al. (1998).

Para efeitos de comparação são detalhados os aspectos geológicos das regiões situadas à sudeste de Araxá (item 2.2.3) e à noroeste de Araxá (item 2.2.4).

2.2.2. Principais contribuições à geologia da região de Araxá.

A caracterização geológica de cunho regional mais importante na região de Araxá foi o levantamento de Barbosa et al.(1970). Estes autores descrevem cinco unidades estratigráficas para o pré-cambriano: Complexo Granito-Gnáissico, Grupo Araxá, Grupo Canastra, Formação Ibiá e Grupo Bambuí, posicionadas cronologicamente nesta ordem da mais antiga para a mais nova.

2.2.2.1. Complexo Granito-Gnáissico.

Segundo Barbosa et al. (1970) o Complexo Granito-Gnáissico ( granitos g 1 da figura 2.2) compreende gnaisses e granitos de composição granodiorítica com intercalações de anfibolitos. Esta unidade foi considerada o embasamento das rochas do Grupo Araxá, estando os gnaisses interpenetrados com os xistos por efeito de deformação, causando-lhes " feldspatização incipiente". Segundo os mesmos autores "...é comum se encontrar fortes indícios de cataclase nos contatos destas duas rochas" e "De um modo geral, o contato entre esse grupo mais antigo e os xistos Araxá não é nítido e nota-se sempre uma zona de transição com xistos feldspáticos ou gnaisses bandeados". Também observam que "Os anfibolitos parecem ocorrer sempre no contato dos gnaisses com os xistos" e que "Cortando os gnaisses, são muito comuns os pegmatitos com schorlita". Destacam ainda a existência de intrusões granodioríticas nos xistos como as de Estrela do Sul e Davinópolis, Minas Gerais, relacionando-as ao Complexo Granito-Gnáissico. Paulsen et al. (1974) observaram "...diques estreitos de biotita-granito a granodiorito" encaixados em filitos e xistos a leste de Araxá, próximo à localidade de Argenita. Estes autores afirmam que "... os diques granodioríticos foram indubitavelmente sincinematicamente intrudidos na foliação e são também foliados" e que "...não existem gnaisses propriamente ditos, mas uma impregnação dos xistos micáceos com material pegmatítico", onde Barbosa et al. (1970) os mapearam como gnaisses graníticos. Paulsen et al. (1974) também referem-se a rochas metabásicas em forma de diques intercaladas a filitos e micaxistos do Grupo Araxá, encontradas a norte de Argenita e não discriminadas no mapa de Barbosa et al. (1970). Petrograficamente, estas rochas são anfibolitos, granada-anfibolitos e metagabros de granulação grosseira.

Ferrari (1989a) refere-se às rochas granito-gnáissicas no mesmo sentido de Barbosa et al. (1970), relacionando-as ao embasamento do Grupo Araxá e salienta "...que a extrema decomposição intempérica dos litótipos constituintes do Complexo Granito-Gnáissico e, em especial, as variedades gnáissicas com clorita, biotita e muscovita conduzem a interpretação errônea de se tratarem de rochas xistosas e confundí-las com as do Grupo Araxá". O mesmo autor comenta que esta dificuldade se extende às zonas de cisalhamento que afetam o complexo granito-gnáissico.

Simões e Navarro (1996) destacam que os xistos relacionados ao Grupo Araxá "...encontram-se associados a extensos domínios de biotita-gnaisses" e sugerem que "...ao menos alguns dos corpos devem representar intrusivas graníticas no Grupo Araxá , e outros podem corresponder a paragnaisses relacionados ao próprio Grupo Araxá". Estes autores inserem as rochas granito-gnáissicas no domínio tectônico Interno da Faixa Brasília em conformidade com a sugestão de Fuck et al. (1993) (figura 2.3).

Soares et al. (1994) apresentam esta unidade como granada granitóides posicionados no Proterozóico Inferior (figura 2.2).

2.2.2.2. Grupo Araxá.

Aos micaxistos encontrados em torno da cidade de Araxá ( ARX na figura 2.2 ), Barbosa (1955) conferiu a designação de Formação Araxá, renomeada posteriormente para Série e Grupo (Barbosa et al., 1970), termo este que, nos anos subsequentes, tornou-se clássico na literatura geológica da Faixa Brasília. Segundo aquele autor o Grupo Araxá compõe-se de "...metamorfitos de facies epidoto-anfibolito, consistindo essencialmente de micaxistos e quartzitos, com intercalações de anfibolitos". Barbosa et al. (1970) referem-se a eles como "...constituidos de duas micas, comumente com predomínio de muscovita" e "...como acessórios

Figura 2.3. Mapa geológico da Sinforma de Araxá, mostrando os três domínios tectônicos da Faixa Brasília, segundo Simões e Navarro (1997).

granada, que pode se constituir num mineral importante, rutilo, zircão, turmalina e estaurolita", além de cianita, sendo "comum se encontrar faixas de xisto com grandes palhetas de muscovita ou concentrações pegmatóides". Estes autores comentam que os quartzitos não têm grande expressão e consistem de lentes e leitos delgados.

Para Paulsen et al. (1974) os micaxistos do Grupo Araxá e os filitos da Formação Ibiá diferem apenas quanto ao grau metamórfico, sugerindo uma zona de transição entre os mesmos a norte de Argenita (figura 2.2), ao contrário de Barbosa et al.(1970) que assinalam falhamento de empurrão entre estas unidades, com os xistos Araxá sobrepostos aos filitos Ibiá. Polêmica semelhante é apresentada por Ferrari (1989b) que, estudando a região a sudoeste de Patrocínio e norte de Araxá (figura 2.2), afirma que os litótipos destas unidades acham-se intercalados repetidamente, sem ter constatado a existência de falhamentos entre ambas. O mesmo autor diz que "Os perfis geológicos...evidenciaram que ao quartzo-clorita-sericita-carbonato xisto típico da Formação Ibiá intercalam-se rochas quartzo-micáceas finamente laminadas que, nas imediações e no rio Quebra Anzol dentro da ambiência do Grupo Araxá, estas passam a predominar mas contêm intercalações do xisto Ibiá . Nos saprólitos das rochas finamente laminadas são encontrados raros olhos de feldspato caulinizado (porfiroclastos) envoltos pela matriz quartzo-sericítica-clorítica. Em ambos os conjuntos são comuns os boudins de quartzo de veio amarrotados nas rochas complexamente plissadas". Discute as paragêneses metamórficas e afirma que "Estas evidenciam ter o grau metamórfico alcançado entre o topo da facies xisto verde e o limiar do epidoto-anfibolito com posterior imposição de uma fase diaftorética ao nível baixo da facies xisto verde" e que esta fase "...foi acompanhada também de um evento metassomático gerador de muscovita, quartzo, albita e feldspato potássico, impondo a quaisquer litótipos do Grupo Araxá, bolsões e vênulas pegmatóides que lhes confere um aspecto de xisto gnaissóide". Este evento retrometamórfico também é descrito por Simões e Navarro (1996), que o caracterizam em todo o domínio Interno, mas cujos efeitos mais evidentes encontram-se junto ao contato deste domínio com as rochas do domínio Externo, "...estando relacionado com o cavalgamento do domínio Interno sobre o domínio Externo" (figura 2.3).

2.2.2.3. Grupo Canastra.

Ao conjunto de metamorfitos que ocorrem ao leste e ao sul de Araxá e ao longo da Serra da Canastra (figura 2.2 e 2.3), Barbosa (1955) denominou de Formação Canastra, posteriormente elevada à categoria de Grupo (Barbosa et al., 1970), posicionando-o acima do Grupo Araxá, em função do contraste metamórfico entre estas duas unidades, embora admitisse que a verdadeira relação entre as duas seja incógnita, uma vez que seus contatos se fazem por falhas. Barbosa et al. (1970) caracterizam estas rochas como quartzitos, filitos e xistos, além de filitos granatíferos, filitos grafitosos, quartzitos ferruginosos e itabiríticos. Segundo estes autores "Os filitos são na maioria quartzo-filitos, isto é, lâminas de filito intercaladas por lâminas delgadas de quartzito de granulação muito fina até síltica", predominando amplamente sobre os quartzitos. Estes últimos formam unidades geológicas bem delimitáveis a sul de Argenita de acordo com Paulsen et al. (1974). Tais autores denominaram estes metamorfitos de sequência quartzito-filito e descrevem-na como uma sequência de camadas alternadas de quartzitos e filitos e de xistos grafitosos e itabiritos e que "...embora exista uma predominância de filitos, zonas de transição de filitos para micaxistos e granada-micaxistos podem ser também observadas". Sugerem também que esta transição indica um aumento do grau metamórfico de norte para sul dentro da sequência.

Braun e Baptista (1978) referem-se à Serra da Canastra como sendo "formada por blocos erguidos por falhamentos inversos e reativados em alguns lugares por transcorrência" a exemplo "da Serra de Pirapetinga ( figura 2.2 ), logo a sul de Araxá, onde os quartzitos com intercalações de xistos foram soerguidos para norte, o que é nitidamente observável pelas dobras...

Continuação...