UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA-INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
/ TESE DE DOUTORADO No 5 - MANFREDO WINGE
EVOLUÇÃO DOS TERRENOS GRANULÍTICOS DA
PROVÍNCIA ESTRUTURAL TOCANTINS, BRASIL CENTRAL
1.INTRODUÇÃO
1.1.APRESENTAÇÃO
Os terrenos granulíticos têm atraído a
atenção de muitos pesquisadores face à importância como componente essencial de
extensas faixas (mobile belts) pré-cambrianas da Terra e face as suas
características petrológicas, com paragêneses minerais que atestam reações
metamórficas em condições anidras de altas temperaturas e pressões de crosta média a
inferior.
Granulitos estão, junto com os grey
gneisses que a eles se associam nos terrenos de alto grau, entre as rochas mais
antigas da Terra conforme datações geocronológicas diversas (e.g.Griffin et al.,1980;
Black et al.,1986).
A frequente associação dos terrenos
granulíticos com terrenos granito-greenstone, em compartimentos distintos de
velhos cratons polifasicamente retrabalhados, tem levado a propostas de evolução
genética comum para estas grandes unidades, utilizando-se modelos relacionados com as
características geo-termodinâmicas próprias do Arqueano. Fortuitamente, granulitos e greenstone
belts são encontrados lado a lado. Normalmente, eles apresentam contatos tectônicos,
mas, também são encontradas transições ou vestígios de transições como no Limpopo
Belt (Coward et al.1976), no Grupo Capim, na Bahia (Winge & Danni,1980; Winge,1984),
no Complexo Jequié no Sul da Bahia (Barbosa,1992). Estas transições estimularam a
formulação de propostas de uma evolução arqueana conjunta para os dois tipos de
terrenos. Por isto, foi selecionada área para ser detalhada, a leste de Americano do
Brasil, com vistas a verificar as relações genéticas entre tais compartimentos que aí
ocorrem lado a lado.
Entretanto, é comum a associação de
faixas granulíticas com estruturas de falhas inversas e nappes de cinturões
metamórficos dobrados de diversas idades o que tem favorecido a aceitação de modelos
evolutivos atualísticos, relacionados a eventos de encurtamento ou de estiramento
litosférico como propostos, por exemplo, respectivamente, por Dewey & Burke (1973) e
por Sandiford & Powell (1986).
Neste sentido, muitas pesquisas vêm
apontando idades mais jovens do que as arqueanas, frequentemente meso a neoproterozóicas,
tanto para a gênese dos protolitos quanto para o metamorfismo dos terrenos granulíticos
como, por exemplo, em Sri Lanka (Saxena,1977; Schumacher et al.1990), e em Goiás (Fuck et
al.,1988, 1989; Ferreira et al.,1992a,1994a).
A ocorrência de grandes complexos
máfico-ultramáficos granulitizados (Barro Alto, Niquelândia, Canabrava) no Brasil
Central tem estimulado muitos estudos geológicos face, principalmente, ao potencial
metalogenético que podem representar de acôrdo com as duas propostas genéticas que têm
sido defendidas para estes complexos: origem ofiolítica ou estratiforme.
Neste contexto situa-se o presente
trabalho como defesa de tese de doutoramento dentro da linha temática Geologia
Regional. Nele são apresentados uma breve revisão temática introdutória, o quadro
geológico dos terrenos granulíticos da Província Estrutural Tocantins (Almeida et
al.,1977,1981) no Brasil Central, com base em dados e interpretações de pesquisas
anteriores integrados com os obtidos no presente trabalho e uma discussão sobre estes
dados e interpretações, visando-se definir um modelo tectônico em que se insere a
evolução destes terrenos de alto grau metamórfico. Ao invés de selecionar,
exclusivamente, uma área de detalhamento, optou-se por uma abrangência areal maior,
envolvendo os principais complexos granulitizados com o fito de compará-los em um
contexto regional, o que implicou, consequentemente, em uma perda de profundidade em
vários tópicos.
Durante o desenrolar da pesquisa, houve
aporte significativo de novos conhecimentos e modelos sobre a evolução crustal
proterozóica da região, envolvendo, associadamente, a origem e transformação da crosta
inferior granulito-migmatítica que era tida até então, pelos dados geocronológicos,
como de longa residência crustal (protocrosta arqueana). Isto exigiu a ampliação das
questões pertinentes à evolução dos granulitos como, por exemplo, a abordagem da
evolução geotectônica de várias unidades supracrustais e de rochas que lhe são
intrusivas, justificando, desta maneira, a abrangência colocada no texto a seguir.
A presente pesquisa tem como objetivos
definir o cenário geológico em que se desenvolveram os terrenos granulíticos da
Província Estrutural Tocantins e propor modelo geotectônico evolutivo referente à
gênese dos protolitos, ao metamorfismo e à ascensão crustal destes terrenos de
alto grau metamórfico.
Para atender estes objetivos de amplitude
regional, foi dada ênfase na integração cartográfica a partir de pesquisas geológicas
anteriores, reinterpretada sobre imagens de satélite do INPE-Instituto de Pesquisas
Espaciais e de radar do RADAM-Projeto Radar na Amazônia, tendo-se como meta a obtenção
de uma base geológica tectono-estrutural em 1/500.000, que permitisse estabelecer a
ambiência geológica na qual evoluíram os complexos granulíticos.
Com o objetivo de esclarecer também as
relações geológicas entre os terrenos granulíticos e greenstone que,
constantemente, estão associados, teve-se como meta a cartografia em 1/50.000 de região
selecionada, onde ocorrem lado a lado estes terrenos.
O estudo petrológico, lito-geoquímico e
termo-barométrico de rochas de áreas críticas, selecionadas a partir dos levantamentos
regional e de detalhe, como base metodológica para a compreensão dos processos mais
globais da evolução, foi outra meta envolvida nos objetivos da pesquisa.
1.3. LOCALIZAÇÃO E ASPECTOS FISIOGRÁFICOS
A área de integração de dados do
presente trabalho é delimitada pelas coordenadas: 13o - 18oS e 48o-51o
W (Figura 1.1), sendo
drenada por rios da Bacia Amazônica (Rio das Almas, Tocantins..) e da Bacia do Rio
Paraná (Rio Corumbá, Anicuns, dos Bois...).
O regime pluviométrico do Brasil Central
é característico com duas estações bem definidas, uma de seca (outubro a abril) e
outra de chuvas continuadas, frequentemente torrenciais (média anual de 1.700 mm
aproximadamente). As temperaturas são de clima sub-tropical (média anual de 22oC)
bastante estáveis ao longo do ano pela ocorrência de chuvas nos meses mais quentes e de
seca nos mais frios.
O desenvolvimento geomorfológico,
relacionado com a estabilização cratônica do fim do Mesozóico ao Terciário propiciou,
em condições climáticas mais úmidas do que as atuais, o esculpimento de uma
superfície peneplanada, com depósitos residuais detrito-lateríticos que sustentam a
topografia originando-se extensas chapadas elevadas. Desde então, a região vem sendo
dissecada devido à lenta epirogênese positiva.
Em decorrência do clima e dos solos
fortemente lixiviados dos peneplanos preservados, a vegetação característica é a do
Cerrado, em que se combinam ora campos sujos, ora savanas com árvores de médio porte
retorcidas devido ao stress provocado pela carência de nutrientes com excesso de
Al e Fe do solo. Nas áreas dissecadas ou testemunhais da peneplanização, notadamente em
terrenos mais férteis, granulíticos de composição básica, calcários e outros,
desenvolveram-se solos ricos com cobertura de mata vigorosa, o chamado Mato Grosso Goiano.
O uso extensivo dessas terras férteis,
principalmente para pastagens e cultura de cana para o fabrico de álcool, juntamente com
a dilapidação das matas para extração de madeira e para fabrico de carvão, tem
destruído grande parte dessa cobertura arbórea. Neste processo não tem sido respeitadas
nem as áreas pobres de cerrados. A derrubada de mata nas cabeceiras e ao longo das linhas
de drenagem vem propiciando a degradação sistemática do solo com desenvolvimento de
bossorocas que, principalmente em regiões elevadas e de solo argiloso vermelho dos
granulitos, apresentam-se extensas e muito profundas, carreando toneladas de solo para os
cursos d'água que tendem a colmatação.
1.4. EVOLUÇÃO DOS TRABALHOS; ASPECTOS METODOLÓGICOS
O conhecimento geológico resulta da
análise e interpretação de amostragens da realidade terrestre, sejam amostragens
materiais (rochas, minerais..), sejam amostragens energéticas (gravimetria,
magnetometria.), e que permitem propor modelos de estruturas/ sistemas da organização
geológica espacial/temporal que menos conflite com os dados obtidos.
Assim, realizar pesquisa geológica sem
um conhecimento espacial, ou seja, cartográfico, dos dados amostrados pode levar a
elaboração de hipóteses conflitivas com a realidade.
Na presente pesquisa optou-se por um
desenvolvimento cartográfico do geral para o particular. Em uma primeira etapa,
selecionou-se uma grande área, visando o enquadramento geológico regional dos terrenos
granulíticos e associados. Foram integrados dados de mapeamentos geológicos anteriores,
realizados perfis de reconhecimento ao longo de estradas, realizadas fotointerpretações
sobre imagens de satélite Landsat e de Radar do Projeto Radam, em uma área que se
estende desde o Complexo de Barro Alto até o Complexo Anápolis-Itauçu (Winge,1990). Overlays
em 1/100.000 e 1/250.000 sobre imagens de satélite e de radar foram utilizados para a
integração de dados de mapeamentos anteriores.
A partir desta visão regional, foi
selecionada uma área para detalhamento (etapa 2) no Complexo Anápolis-Itauçu, a oeste
de Itauçu, onde ocorrem, lado a lado, terrenos de greenstone belts e de alto grau (Mapa Geológico anexo),
mapeada na escala de 1:50.000.
Nessa segunda etapa, utilizou-se o SITIM,
SIstema de Tratamento de IMagens de satélite, e SGI, Sistema Geocartográfico de
Informações, do Laboratório de Sensoriamento Remoto da UnB, resultando no
desenvolvimento de técnica específica (Winge et al.,1993) de modularização de
imagens-mapas.
A cartografia geológica, direcionada
para questões de zoneografia metamórfica, juntamente com a falta de dados
geocronológicos e de mapeamento de detalhe, obrigou a utilização do conceito de
unidades litodêmicas (conceito do Código Estratigráfico Norte-americano,
Prothero,1982), tanto no mapa regional quanto no de semi-detalhe.
Para atender a compilação dos dados
geológicos da pesquisa, visando desde mero acesso especializado (retrieval com
saída impressa ou em video) até processamentos específicos subsequentes, o autor
desenvolveu um sistema de registro, atualização, correção e acesso facilitados de
dados geológicos (Geosist) para rodar sob o DBASE III Plus em microcomputador. Este
sistema, em desenvolvimento, permite hoje recuperar os dados de afloramentos, definindo-se
limites de coordenadas ou módulos geográficos de 1x1, rochas e minerais,
teores químicos de rochas, projetos e/ou siglas de geólogos, etc.., e as saídas podem
ser de vários tipos: impressas, padronizadas conforme a listagem sintética do Anexo 6,
em arquivos lotus (wks), dbase (dbf) ou texto (txt) e em arquivos de integração
geocartográfica com imagens de satélites (para os planos de "overlays" de
pontos de afloramentos na imagem).
A partir de questões levantadas na 2a.
etapa, optou-se por ampliar a área de integração regional envolvendo parte da faixa
granulítica a NW de Porangatu, os Complexos de Cana Brava e Niquelândia e o sul do
Complexo Anápolis-Itauçu para permitir uma visão mais ampla do quadro
tectono-estrutural onde se encontram os terrenos granulíticos.
Cerca de 640 afloramentos e 270 lâminas
delgadas foram estudados, em sua maior parte correspondentes à área de detalhamento. A
localização dos pontos estudados na área de detalhamento pode ser vista no Mapa de
Pontos Anexo. Outros pontos citados no texto podem ser localizados a partir das
coordenadas indicadas no Anexo 6 (Listagem Sintética dos Dados).
Foi realizado um perfil de reconhecimento
no Complexo Niquelândia juntamente com Prof.A.A.Nilson por ocasião da preparação do
roteiro de excursão para o I Encontro Brasileiro sobre Elementos do Grupo da Platina,
quando foram obtidas as fotos 1 a 9 (anexo2).
O mapa geológico regional em 1/500.000 (no Anexo 9
reduzido para 1/1.000.000) foi obtido por redução de mapas em 1/250.000 decorrentes
dessa compilação com reinterpretações de trabalhos anteriores. Grande número de mapas
de pesquisas diversas foram utilizados. Cabem ser destacados os mapas dos trabalhos de
graduação da UnB em 1:50.000 dos anos 1974, 1977, 1978, 1979, 1980, 1981, 1982,
1986,1988 sob a coordenação dos professores J.O.Marini, J.O. de Araujo Fo., R.A.Fuck,
J.C.M.Danni, O.H.Leonardos e A.A.Nilson, diversos mapas de dissertações de mestrado e
doutorado (Stache,1976; Figueiredo, 1978; Souza, 1973; Simões,1984; Barbosa,1987;
Strieder, 1989; Amaro,1989; Silva, 1991; Nunes, 1990; Wolff,1991), mapas dos projetos
Brasília (Barbosa et al., 1981) , Goiânia (Barbosa,1970), Goiânia II (Pereira et
al.,1980), Bandeirantes (Olivcira & Bittar,1971) do DNPM, Porangatu (Machado et
al.1981), Canabrava-Porto Real (Araujo & Alves,1979), Pontalina (Araujo et.al.,1980),
mapas metalogenéticos em 1:250.000 (folhas Uruaçu, Ceres, Goianésia, São Luis de
Montes Belos e Goiânia) publicados pelo DNPM, mapas da NUCLEBRÁS (1978)..
As análises de rochas foram realizadas
no LAGEQ-Laboratório de Geoquímica do Departamento de Geoquímica e Recursos Minerais.
Os elementos maiores foram determinados por espectrometria de plasma (ICP) com abertura
por fusão com LiBO4; os elementos traços e menores foram dosados também no
ICP após abertura por disgestão ácida (HF/HClO4/HNO3 /HCl); o
equipamento utilizado é o modelo SPECTRO FVM03. O FeO foi determinado por volumetria
usando K2Cr2O7. Os ETR- Elementos Terras Raras- foram
analisados no GEOLAB da empresa GEOSOL por ICP. Para facilitar o processamento das
análises foi desenvolvido dentro desta pesquisa, mas atendendo objetivo de uso geral, um
sistema de registro, arquivamento e recuperação dos dados químicos em microcomputador
para o LAGEQ.
No processamento de dados de química de
rochas foi utilizado o SISTEMA NEWPET 1987-1990 desenvolvido pelo Centre for Earth
Resources Research do Dept. of Earth Sciences da Memorial University of Newfoundland,
além de sistemas de uso geral (Lotus, Excell..) e, salvo quando indicado, os parâmetros
de normalização para MORB, condrito, manto primordial.. são os constantes deste sistema
distribuído em freeware.
As análises químicas de minerais foram
realizadas no Laboratório de Microssonda do Departamento de Mineralogia e Petrologia da
UnB, utilizando-se o sistema de microssonda Cameca.
Para os estudos geo-termobarométricos,
utilizou-se o programa THERMOCALC (Powell & Holland,1988) e o programa PTMAFIC,
desenvolvido por J.I. Soto Hermoso, Departamento Geodinamica, Universidad de Granada.
Análises geocronológicas (Rb-Sr) foram
realizadas dentro do convênio IG-UnB/IG-USP com preparação inicial na UnB e dosagens
isotópicas na USP.
1.5. GRANULITOS E GRANULITIZAÇÃO: UMA BREVE REVISÃO
1.5.1. Terminologia
A gênese das rochas granulíticas é
controvertida, o que tem colaborado para a criação de muitos têrmos para designá-las
(ver Anexo 1).
O termo granulito, derivado do
latim (granulum), foi utilizado, originariamente, por autores alemães para
designar leptinitos de Granulitgebirge, Floresta Negra (Rinne et al. 1949) em função,
essencialmente, da textura fina e granuloblástica que apresentam. Segundo
Miyashiro(1973), o nome granulito significava originariamente rochas com textura
granulítica, caracterizada por bandas ou fitas, por vezes inconspícuas, de diferentes
minerais com tendência equigranular e equidimensional. Este termo tem sido usado com
conotação variável, de petrográfica faciológica (fácies metamórfica granulito de
Eskola,1939 in Turner & Veerhoogen,1960) a geotectônica, relacionada com a
compartimentação em cinturões de alto grau metamórfico (cinturões granulíticos ou granulític
mobile belts). A utilização frequente na bibliografia para designar as próprias
rochas dos cinturões granulíticos contraria propostas como as de Winkler (1977), que
sugeriu reservar o uso do termo granulito para a designação da fácies metamórfica,
atribuindo têrmos especiais (granolito, granoblastito..) para especificar as
rochas granulitizadas.
Neste trabalho, o termo granulito será
utilizado, conforme uso corrente, com um sentido amplo, servindo tanto para designar a
fácies metamórfica quanto as rochas metamorfizadas nessa fácies, além de englobar as
rochas plutônicas e/ou anatéxicas associadas (charnockitos, enderbitos, mangeritos..)
que cristalizaram debaixo das mesmas condições de pressão e temperatura. Assim, os
granulitos compreendem rochas de composição variada, de origem intra ou supracrustal,
que sofreram metamorfismo da fácies granulítica. Isto vem simplificar a nomenclatura das
rochas granulitizadas com o uso substantivado ou adjetivado do termo granulito como, por
exemplo: diorito granulítico; granulito ácido; granulito granodiorí-tico, etc..
1.5.2. Litotipos - características gerais
As associações litológicas dos
terrenos granulíticos compreendem rochas de diversos tipos e origens. Podem ocorrer, lado
a lado, como é o caso da área de estudo, rochas meta-ultramáficas, gnaisses, leptinitos
e outras rochas silicosas e/ou aluminosas, meta-máficas...
Sem dúvida, os protolitos mais comuns
são plutônicos, mas, supracrustais podem ser expressivas, como, por exemplo, no Complexo
Jequié, Bahia (Figueiredo & Barbosa,1993).
As texturas e estruturas tipomorfas são
variadas: desde maciças, muito comuns, a fortemente foliadas. Geralmente são rochas
granoblásticas, em mosaico, em consequência das paragêneses essencialmente anidras com
minerais equidimensionais. São bastante comuns, entretanto, texturas miloníticas
(milonitização "a seco"). Texturas e estruturas reliquiares, parcial ou
totalmente preservadas (xenólitos angulosos, acamadamento ígneo, texturas coronítica,
cumulítica, porfirítica..), ocorrem, localizadamente, lado a lado com as texturas
derivadas de fortes deformações.
Esta variabilidade de texturas e
estruturas, com porções preservadas entre faixas fortemente deformadas e estiradas, é
verificada desde a escala microscópica até a escala de afloramentos e indica, como
característica geral, que a deformação metamórfica foi heterogênea, não pervasiva.
Bolsões ou veios de material anatéxico
ocorrem principalmente associados a fácies mais ácidas e muitas vezes podem representar
transições para terrenos migmatíticos.
Massas plutônicas ou anatéxicas da série
charnockítica, com granulação grossa e equidimensional, com cores normalmente escuras,
são comuns em terrenos de alto grau e costumam gradacionar para fácies deformadas das
encaixantes.
1.5.3. Metamorfismo granulítico: conceito e condições físico-químicas
O metamorfismo granulítico é
conceituado (e.g.Yardley,1989) como um processo de amplitude regional, desenvolvido em
ambiente geológico com baixa atividade de H2O (anidro), altas temperaturas,
pressões litostáticas crustais e gradiente geotérmico elevado a, mais raramente,
intermediário.
As determinações termobarométricas das
paragêneses tem indicado para as variáveis intensivas condições comuns entre 700 e
850oC (atingindo até 1000o C) e pressões em torno de 8 kbar, variando de valores
inferiores a 5 até 12 kbar (Figuras 1-2C,
D e E).
Green & Ringwood (1967) propuseram a
divisão da fácies granulito (Figura
1-2C) em baixa, média e alta pressão, esta transicionando para fácies
eclogito, com base em associações minerais estáveis como:
i) baixa P: opx+cpx+plagioclásio;
ii) média P:
granada+opx+cpx+plagioclásio; cordierita+granada+K feldspato +quartzo;
iii)alta P: granada+cpx+quartzo;
granada+quartzo; cianita+granada+Kfeldspato +quartzo.
A fácies granulito transiciona para a fácies eclogito de alta T quando, acima de 10 kbar, em condições também anidras, começa nas fácies básicas a desestabilização da fase plagioclásica, que passa a ser incorporada, em moléculas jadeíticas em cpx onfacítico e grossuláricas em granada magnesiana, dada a reação metamórfica:
opx+plagioclásio= cpx+granada+quartzo.
A zoneografia metamórfica nos cinturões
granulíticos de áreas cratônicas mostra extensas áreas frequentemente caracterizadas
por pobreza ou ausência de isógradas progradantes. Os limites tectônicos destes
cinturões são os mais comuns. Entretanto, em diversas regiões ocorrem exceções como,
por exemplo, no Craton de Dharwar, sul da Índia, onde é observada a transição de
fácies xisto verde até granulito (Newton, 1990).
Em terrenos ofiolíticos fanerozóicos
como, por exemplo, os ofiolitos Yakuno (Ishiwatari,1985,1991) e Horokanai (Ishizuka,1985)
no Japão, e junto a estratos tectônicos de diversas outras estruturas ofiolíticas do
mundo (Nicolas,1989), são verificadas transições desde fácies granulito até xisto
verde e mais baixo em que a zoneografia metamórfica geralmente está invertida nos
níveis intracrustais a supracrustais obductados por assoalho mantélico alóctone
fortemente aquecido.
A existência de inclusões fluidas com
poucos micra de diâmetro, constituídas essencialmente por CO2 em minerais granulíticos
(e.g. Touret, 1981), demonstra a participação de fase rica em CO2 , diluindo
a fase hidratada no metamorfismo granulítico. Estas determinações tem levado a se
pesquisar isotopicamente a natureza desta fase fluida que seria, para muitos autores
(e.g.Newton et al,1980;Newton,1990) essencial para as reações metamórficas de
granulitização através de fluxo carbônico de possível origem mantélica. England
& Thompson (1984) analisam as condições de transferência de calor na crosta
terrestre, considerando que o mecanismo de difusão extensiva de fluidos abaixo de 10 km
de profundidade é muito limitado, devido à baixíssima permeabilidade de rochas em
regime dúctil ao que se acrescenta o selamento de poros devido a reações metamórficas
das fases minerais e fluidas. Harley (1989) também discute esta questão e coloca em
dúvida este processo, permitindo-se optar por um ambiente de granulitização tipificado
por fluido ausente; a ação da fase CO2 seria localizada ou canalisada
em espaços restritos.
Tem sido determinada transição
isobárica entre fácies anfibolito (com inclusões fuidas aquosas) e granulito
(inclusões fluidas carbônicas) como, por exemplo, no SW da Finlândia (Schreurs,1984)
onde as inclusões fluidas e as paragêneses apontam temperatura de 750 a 820oC e
pressões de 3 a 5 kbar.
A natureza pouco hidratada da fase
fluida, com aH2O geralmente entre 0,1 e 0,2 (Harley,1989), é, sem dúvida, um dos
fatores essenciais do metamorfismo granulítico porque nas condições termodinâmicas
citadas, as rochas sofreriam, sob PH20=Ptotal, extensiva migmatização e anatexia devidas
ao rebaixamento da temperatura de fusão proporcionado pela entrada de H2O no sistema,
polimerizando os tetraedros de sílica. Assim, quando as condições do fluido atingem aH2O>0.25
desenvolvem-se fácies migmatíticas no campo do metamorfismo granulítico pela
migmatização e anatexia de componentes granitófilos das rochas (ver Figura 1-3).
Esse metamorfismo corresponde a
condições crustais de 10 a 35 km de profundidade em ambiente de alto a médio gradiente
geotérmico. O estudo evolutivo das paragêneses metamórficas das rochas granulíticas
(e.g. Sandiford & Powell,1986) em diagramas PTt indica que é muito frequente o
processo de resfriamento isobárico. Entretanto, os estudos de evolução paragenética
também indicam que muitos terrenos granulíticos evoluíram com descompressão
isotérmica (Figuras 1-2A e B).
A caracterização dos terrenos
granulíticos a partir dos cálculos termobarométricos da sucessão paragenética
mineral, constitui-se, hoje, em importante ferramenta para fundamentar as propostas de
ambiência e evolução crustal destes terrenos. Existem vários modelos tanto para
explicar a evolução no sentido horário (descompressão isotérmica) quanto no sentido
anti-horário (resfriamento isobárico), sendo que cada modelo depende de detalhes do
diagrama PTt e do contexto geológico. De uma forma geral, pode-se dizer que os terrenos
com resfriamento isobárico relacionam-se a evolução crustal com taxa de erosão pouco
significativa logo após o metamorfismo granulítico e, associadamente, com uma
residência crustal que tende a ser mais prolongada. Por outro lado, a descompressão
isotérmica implica em taxas rápidas seja de erosão, soerguimento tectônico e/ou
descolamentos litosféricos (como reversão de nappes) para assegurar mínimo
declínio da temperatura após a granulitização, enquanto os granulitos ascendem
rapidamente em direção à superfície.
1.5.4.Distribuição espacial e temporal dos granulitos
As rochas granulitizadas ocorrem na superfície terrestre, tanto em domínios continentalizados, quanto oceânicos. Os principais tipos de ocorrências são:
1-cinturões ou faixas de rochas
granulíticas, geralmente com centenas de quilômetros de extensão, os mobile belts
ou high grade terrains, em áreas cratônicas, geralmente muito antigas,
polifasicamente retrabalhadas;
2-em núcleos ou raízes
granito-migmatíticas de cinturões orogênicos como paleossomas (enclaves) granulíticos
em migmatitos e anatexitos;
3-em sistemas ofiolíticos,
principalmente junto a contatos com corpos ultramáficos mantélicos onde massas
obductadas alóctones provocam metamorfismo de alto grau sobre estratos crustais
cavalgados com zoneografia decrescente em profundidade;
4-como xenólitos, registrando coleta de
níveis crustais inferiores, junto com eclogitos e outras rochas profundas em aparelhos
vulcânicos a subvulcânicos de magmatismo de rápida ascensão, principalmente nas
províncias continentais alcalinas e kimberlíticas;
5-no contato de corpos intrusivos
básicos podem ocorrer auréolas, geralmente pequenas, de forte aquecimento e
desidratação onde desenvolvem-se paragêneses da fácies hiperstênio hornfels iguais
às da fácies granulito regional.
As idades dos terrenos granulíticos de
áreas cratônicas (high grade terrains) são muito variadas. Algumas, estão entre
as mais antigas na Terra (e.g. no Oeste da Groenlândia com cerca de 3,6 Ba.- Griffin et
al.1980, cerca de 3,0 Ba. na Bahia - Barbosa,1992). Várias datações, entretanto,
indicam idades mais jovens para o metamorfismo granulítico, sendo frequentes às do Meso
a Neoproterozóico, como e.g.: 1.3 Ba. na India e Sri Lanka (Saxena,1977); 0.6 Ba. em
Madagascar(Kroner,1991); 1,3 e 0,79 Ba. no Complexo de Barro Alto (respectivamente Fuck et
al.1988 e Suita et al..,1994); 0,78 Ba. no Complexo de Niquelândia (Ferreira et
al.1994a).
Os high grade terrains ocorrem
como faixas (mobile belts) com extensões de centenas de quilômetros separando ou
bordejando os terrenos granito-greenstone de áreas cratônicas arqueanas sendo
que, em uma recomposição do supercontinente Pangaea, pode-se perceber uma continuidade
dos traços estruturais relacionados com os terrenos de alto grau e que tem "sido
usada como evidência contra extensivos movimentos de deriva continental entre o Arqueano
e o Fanerozóico" (Windley,1977).
No Brasil, os terrenos granulíticos
deste tipo dispõem-se aparentemente associados aos greenstone belts (Figura 1-4) e, também, com uma
continuidade que sugere terem sido pouco deslocados pelos episódios tecto-orogenéticos
ligados às faixas de dobramentos que os interceptam.
Além dessas características, é comum a
associação de complexos gabro-anortosíticos com as faixas granulíticas.
Os cinturões granulíticos mostram uma
localização preferencial junto a suturas colisionais de diversas idades, como no Escudo
de Aldan, junto ao cinturão dobrado fanerozóico Okhotsk-Mongoliano (Kazanski &
Moralev,1981); no Escudo da Bohemia, junto ao cinturão variscano/herciniano (Medaris
et.al.1990); e também, na área do presente estudo, junto ao cinturão
brasiliano-uruaçuano.
Todas estas áreas foram palco, em maior
ou menor grau, de retrabalhamentos crustais - shearing, hidratação, diaftorese,
anatexia e migmatização... - verificando-se, também, episódios magmáticos vários.
Como resultado tem-se uma elevada complexidade estrutural, litogênica e paragenética.
Assim, por exemplo, na Amazônia (Wernick,1981), é comum os granulitos ocorrerem de forma
limitada em terrenos migmatizados. Na Bahia e no Nordeste do Brasil também se verifica,
comumente, a migmatização como um processo superimposto de estágio ou ciclo geralmente
mais jovem do que o que propiciou a granulitização.
Observa-se, também, a ocorrência de
terrenos granulíticos de diversas idades junto às atuais margens continentais e
micro-continentais, ativas ou não-ativas, como na Índia e em Sri Lanka; na região do
Limpopo; na Ilha de Madagascar; na Groenlândia; em toda a costa leste e sudeste
brasileira (ver Mapa Geológico do Brasil em 1:2.500.000, DNPM, 1984). Também ocorrem em
regiões de rifts continentais como na linha tectônica Lake Tanganika-Lake Malawi;
entre Lake Victoria e Lake Rudolph, na África;...(ver Geological Map of Sectors of
Gondwana; Univ. of Witwatersrand, 1988). Esta disposição tem sido objeto de análises e
especulações diversas (e.g. Fyfe & Leonardos, 1974; Winge, 1990) relacionando a
incidência de rupturas continentais com terrenos de alto grau metamórfico.
Ocorrências de rochas granulitizadas
mais jovens e de dimensões mais limitadas do que as dos terrenos précambrianos de alto
grau verificam-se junto a sistemas ofiolíticos fanerozóicos como, por exemplo, os
ofiolitos Horokanai (Ishizuka,1985) e Yakuno (Ishiwatari,1991) no Japão; Sulawesi (Helmen
et.al.1990) na Indonésia; no Alaska, na Cadeia dos Aleutas (De Bari & Coleman, 1989).
Os complexos acrescionários
circumpacíficos (margem panthalássica) desenvolveram-se ao longo de todo o Fanerozóico
envolvendo eventos sucessivos de geração e colocação de sistemas ofiolíticos em uma
superposição de cinturões de nappes ofiolíticas, a maior parte deles
relacionada a ambientes frente, intra e trás-arco. Estas ocorrências notabilizam-se pela
ausência de níveis de sheeted dikes e pela existência de metamorfismo de alto
grau nas fases máficas (Ishiwatari, op.cit.). O ofiolito de Yakuno, Japão, representa
crosta oceânica de um sistema "arco de ilha - bacia marginal" excepcionalmente
espessa (15 a 30 km) com uma seção de vulcânicas, cumulados e peridotitos residuais
onde o grau metamórfico aumenta para a base e atinge a fácies granulito no interior da
seção dos cumulados. Em nappes do cinturão Sanbagawa, Japão, corpos de
metagabro e de dunito/eclogito apresentam, localmente, uma mineralogia primária de
fácies granulito de alta T antecedente ao metamorfismo de alta P. Nicolas(1989) reporta
62 localidades onde ocorrem ofiolitos com paragêneses de alta temperatura/baixa pressão
em vários ambientes geológicos.
Fora de ambientes oceânicos, como por
exemplo, nos Alpes Centrais Italianos (Droop & Bucher-Nurminen,1984), em ambiente
continental orogênico, também podem ser encontrados granulitos (muitas vezes associados
com mélanges ofiolíticas). O metamorfismo de alta pressão superimposto nestas zonas de
suturas tende a transformar os granulitos em xistos azuis ou em eclogitos.
As ocorrências de xenólitos
granulíticos e eclogíticos em condutos kimberlíticos ou de rochas alcalinas de ambiente
intraplaca continental (exemplo clássico é no Maciço Central Francês - Brousse,1970)
tem servido de apoio à proposta de que a crosta continental inferior é composta
extensivamente por rochas granulíticas. Interessante apontar que os xenólitos
peridotíticos granulitizados das pipes tendem a ser de textura equidimensional
enquanto que os peridotitos ofiolíticos apresentam (Nicolas,1989) textura
porfiroclástica a milonítica.
1.5.5.Os modelos geodinâmicos de geração das rochas granulíticas
Inúmeras propostas de modelos
geotectônicos têm sido apresentadas para explicar a gênese dos terrenos granulíticos
como bem documentado em Windley (1977) e em vários artigos dos simpósios "Archaean
Geology", sp.publ. No.7,1981 - Geol.Soc.of Australia; "ISAP-International
Symposium on Archaean and Proterozoic Geologic Evolution and Metalogenesis" editado
SBG/SME, Salvador, Brazil,1982; "Evolution of Metamorphic Belts" da Geological
Society of London, "Special Publ. 43; 1989".
A ocorrência preferencial de granulitos
em terrenos antigos, associados com greenstone belts e com extensos terrenos de
gnaisses cinza arqueanos, tem estimulado a idealização de modelos evolutivos dentro de
uma linha não-uniformitarista como os de Glikson (1971), Glikson & Lambert(1976),
Fyfe(1973), Katz(1976), De Wit et al, 1992,...
Por outro lado, propostas de evolução
dos terrenos de alto grau dentro de linhas mais uniformitaristas são igualmente
apresentadas e discutidas por vários autores como Dewey & Burke(1973), Burke et
al.(1976), Sandiford & Powell(1986), Harley(1989)...
Praticamente todos os ambientes
geotectônicos atuais, alem de outros que seriam exclusivos do Arqueano (modelos não
uniformitaristas), foram aventados para a evolução dos terrenos de alto grau, a saber:
-falhas transformantes em sítios
continentais de crosta dúctil (aquecida) e fina, associadas a calhas de greenstone
belts, equivalentes arqueanos das ridges (Katz,1976);
-aulacógeno em velho craton com exemplo
no Limpopo Belt associado aos terrenos granito-greenstone de Barberton
(Barton,1981);
-desidratação progressiva, como ocorre
no Complexo de Williama, Broken Hills, Austrália (Binns,1965) ou polifásica em
metamorfismo regional;
-como resíduo progressivamente
empobrecido em H2O e em elementos granitófilos, devido à realização de
processos anatéxico-metassomáticos favorecidos pela alta temperatura e hidratação
(curvas de fusão parcial negativas na grade petrogenética) da crosta arqueana,
originando restito granulítico na base da crosta e material granito/anatéxico mobilizado
para níveis superiores da crosta (Fyfe,1973);
-nas raízes de arcos de ilha maduros,
como no complexo máfico-ultramáfico das Tonsinas, Aleutas (De Bari & Coleman,1989),
onde cumulados gabróicos (underplating) associam-se com fatias mantélicas e,
acima, com volumoso vulcanismo tholeítico alto-Al;
-em arco magmático continental, com a
granulitização relacionada a grande influxo de magma basáltico alojado na base (underplating)
crustal (Bohlen,1987), ou seja, com magmatismo sin-metamórfico, produzindo
resfriamento isobárico comum em vários terrenos granulíticos como nos Adirondacks, na
Groenlândia, etc..;
-ambiente colisional liminar ou
cordilheirano com forte aquecimento da placa oceânica jovem (zonas de ridges, junção
tríplice, falhas transformantes) em subducção a qual se torna mais flutuante,
favorecendo estiramento litosférico e magmatismo associado, como no sul dos Andes (Tarney
et.al.,1976; Nelson & Forsythe,1989);
-proto-ofiolitos com associações
similares às dos greenstone belts em ambiente Cata-arqueano de tectônica
eminentemente verticalizada (Glukovskiy et al.1977);
-colisão em fase compressiva,
engavetando fragmentos crustais siálicos com fragmentos de crosta simática gerada em
fase extensiva anterior e que propiciou também o afinamento crustal e falhamentos
lístricos (Park,1981) em um modelo semelhante ao de "milipede" de Wynne-Edwards
(1976);
-ambiente colisional com litodemas
ofiolíticos obductados ou indentados em prisma vulcano-sedimentar em zonas de mélanges,
provocando metamorfismo decrescente para a base do muro (e.g. Nicolas, 1989).
-ambiente ofiolítico oceânico tipo HOT
de rápida expansão (Nicolas,1989). O desenvolvimento de paragêneses granulíticas
durante a tectônica intra-oceânica em sistemas ofiolíticos, com aquecimento térmico
junto a diápiros astenosféricos, talvez não seja mais evidenciado porque, como sina
geodinâmica, tais terrenos sofrem metamorfismo colisional superimposto, xisto azul a
eclogítico e tendem a ser consumidos como placas em subducção nas zonas de colisão.
-ambiente de ridge (ofiolítico)
tipo Islândia. Em cadeias mesoceânicas, formam-se rochas ácidas, trondhjemiticas
(Coleman,1971) a quartzo-dioríticas (Engel & Fisher,1975) como finos veios (dikelets)
em associação ofiolítica (.."a subordinada mas persistente associação de
trondhjemitos com ofiolitos e basaltos oceânicos representa o produto final de
diferenciação de basaltos subalcalinos dentro de um sistema de ridge" - Coleman,
op.cit.). Em condições especiais de forte aquecimento, como ocorre na Islândia, com hot
spot deslocado da ridge e retrabalhando a crosta oceânica, verifica-se a geração de
até 20% de rochas ácidas (Sigurdsson,1977) subvulcânicas a vulcânicas (riolitos,
granófiros, icelanditos..), associadas a basaltos e sedimentos em condições subaéreas
a subaquáticas. A origem de tal volume de rochas ácidas tem sido objeto de um número
cada vez maior de estudos (e.g. Steinthorsson & Jacoby,1985; Bott,1985; Oskarsson et
al.1985; Helgason,1985; Marsh et al.1991..), visto representarem a geração de crosta
siálica em pleno domínio oceânico. Sem contar com os plateaus Voring e das Ilhas Faroe,
possívelmente desenvolvidos com o mesmo sistema de hot-spot (Vink,1984), nos
últimos 10 milhões de anos (Helgasson,1985) foi construido, na base de 1 cm/ano de
expansão, os 200 km de diâmetro do "mini-proto continente" islândico. Este
cenário sui generis tem sido aventado (e.g. Kroner,1982) como o da origem das
primeiras massas continentais terrestres quando o fluxo calórico era maior e as
interações astenosfera-litosfera mais intensas. A Figura 1-5 esboça um modelo evolutivo que admite a formação
de uma crosta inferior granulitizada na área protocontinental islândica: a acresção de
material mantélico dá-se, de forma intensiva, junto da linha central do rift e o
fluxo plástico destas rochas seria função de deslocamentos litosféricos diferenciais
proporcionados pelo arrasto da convecção astenosférica. Esta tectônica oceânica é
variável e condicionada à velocidade de expansão da ridge. Parte do material
crustal, inclusive supracrustal, é levado, segundo o modelo, para níveis com isotermas
elevadas sofrendo metamorfismo de fundo oceânico desde fácies zeolita até anfibolito e,
em >1000oC junto do Moho, anatexia, com produção de magma ácido dos riolitos
e icelanditos efusivos, e metamorfismo granulítico;
-níveis infracrustais em ambiente
colisional onde ocorreria a desgranitização, originando magmatismo riolítico e deixando
um resíduo anatéxico (modelo Tibetano ou Himalaiano), como proposto por Dewey &
Burke(1973); Burke et al.(1976); Myers(1976). Segundo o modelo tibetano de origem dos
granulitos de Dewey & Burke(op.cit), com o espessamento crustal, a partir de uma
tectônica colisional de continentes como a que ocorre nos Himalaias, a crosta inferior,
diorítica, da placa cavalgada sofreria aquecimento e fusão parcial, originando
magmatismo ácido alto-K que migraria para níveis superiores, extravasando como riolitos
ou cristalizando como granitos e deixando um resíduo refratário anortosítico e
piroxênio granulítico depletado de elementos granitófilos;
- infra-crosta continental. Para Herzberg
et al.(1983) a injeção de magmas primitivos (MORB, picritos, komatiitos..) mais densos
do que as rochas dioríticas a granodioríticas da crosta propicia underplating e
perturbação das geotermas junto ao Moho, a 10-12 kbar, desenvolvendo aí um ambiente de
metamorfismo granulítico. Nos sistemas intrusivos fases anortosíticas flutuariam enquanto
que blocos densos de diferenciados peridotíticos ficariam embaixo e poderiam afundar no
manto Associadamente ocorreriam fusões parciais, devolatização de rochas mais
hidratadas, deformações complexas e outros processos com líquidos menos densos e fases
anatéxicas e hidratadas, cristalizando em níveis superiores. Este conjunto de processos
favoreceria a estratificação crustal.;
-ambientes extensionais em fases tardias
e/ou em compartimentos especiais de uma evolução tecto-orogenética de duplicação
crustal onde se associam rápido estiramento litosférico e diapirismo astenosférico com
magmatismo sub-crustal (underplating), evoluindo para magmatismo tardi-orogênico
bi-modal, e metamorfismo de alto grau como discutido, e.g., por Harley (1989);
-ambientes extensionais de
desenvolvimento intracontinental, como propostos, e.g., por Wickam & Oxbourgh (1985) e
por Sandiford & Powell (1986): estruturas de rift com evolução para bacias
vulcano-sedimentares junto à superfície corresponderiam a perturbações geotérmicas em
profundidade, causadoras do magmatismo e do metamorfismo de alto grau nas raízes desses
sistemas extensionais em regiões como a Província Basin & Range no Centro-Oeste
Americano, no Mar Morto e em outras regiões.
Segundo alguns modelos, como os que
envolvem retrabalhamento de crosta continental, a natureza dos extensos terrenos
granulíticos não necessita estar diretamente vinculada com a geração dos protólitos.
Para outros modelos, entretanto, o metamorfismo granulítico deve estar no tempo-espaço
vinculado com a formação de determinados protólitos segundo um quadro geotectônico de
evolução própria como, por exemplo, a granulitização junto a ofiolitos obductados ou
a granulitização nas raízes de arcos de ilha.
Depois do evento de granulitização as
rochas podem ter residência intra-crustal prolongada (e.g. complexo granulítico de
Enderby Land, Antarctica, Sandiford,1985) ou serem rapidamente transportadas para
níveis mais rasos e expostas à superfície terrestre pela evolução geodinâmica e
erosional (e.g. junto aos ofiolitos circum-pacíficos).
Esta diferença de tempo de residência
crustal depende essencialmente da estabilidade da crosta em que se inserem os granulitos.
Diversos fatores estão envolvidos nesta estabilidade crustal, entre os quais salienta-se,
como fatores inter-relacionados, o equilíbrio densitométrico entre crosta e manto
litosféricos, a dinâmica da evolução tectônica das placas litosféricas e as
perturbações geotérmicas mais profundas. Assim, somente em uma crosta continental
estabilizada pode ocorrer um tempo de residência crustal maior (sempre suscetível de
retrabalhamentos devidos à rupturas continentais com arqueamentos, erosão, etc..)
enquanto que granulitos de geração intra-oceânica não acrescionados a continentes
certamente tem menor tempo de residência crustal porque as placas oceânicas são
subductadas em espaço de tempo não maior do que 200 Ma (e.g.Condie,1989).