Quando milonitizadas, as rochas metamáficas apresentam gradativa redução no tamanho dos grãos. As hornblendas passam a compor porfiroclastos ovalados (figura 5.37), intensamente retrometamorfisados para actinolita e clorita e massas criptocristalinas cinza a castanho escuras, envoltas por matriz fina de clorita-epidoto-quarzto-actinolita. Esta matriz contorna os porfiroclastos, compondo a foliação milonítica. Sob elevada milonitização, ocorre o desaparecimento dos porfiroclastos. Macroscopicamente, as rochas metamáficas milonitizadas, muito finas, assemelham-se com filonitos e foram mapeados genericamente como xistos básicos. Estas rochas constituiram problemas durante os mapeamentos anteriores quando foram confundidas com filitos da unidade Ibiá, pela extrema semelhança sob intemperismo, o que levou à conclusão errônea de passagem gradacional entre os Grupos Araxá e Ibiá ( Paulsen et al., 1974; Ferrari, 1989b).

Os termos ultramáficos compreendem serpentinitos, talcoxistos e anfibólio-talcoxistos (figuras 5.38). Nos serpentinitos foi possível observar-se cristais fantasmas de olivina com formas ovaladas ou aciculares, totalmente substituidos por serpentina. Esta ocorre igualmente nos espaços intergrãos, apresentando trama não orientada nas lentes preservadas de deformação. A serpentina e o talco podem representar produtos de retrometamorfismo sobre uma paragênese anterior que inclui as olivinas. As olivinas com formas aciculares, alongadas, distribuidas aleatoriamente, apresentam uma textura que lembra superficialmente a textura spinifex de lavas ultrabásicas (Evans, 1977). Esta textura metamórfica parece estar superimposta à outra em que, megacristais de olivina ( de até 7 cm de diâmetro) ovalados, acham-se imersos em matriz fina de serpentina e talco.

5.4.2. Rochas metassedimentares.

As rochas metassedimentares do Grupo Araxá compreendem quartzo - mica xistos, mica xistos, granada - quartzo mica xistos, granada – cloritóide – quartzo - mica xistos, quartzitos, quartzitos micáceos e micaxistos feldspáticos.

Os xistos s ão formados por mica branca, quartzo, clorita, biotita, granada, cloritóide e minerais opacos.

A paragênese relacionada ao metamorfismo M1 é de biotita-mica branca-granada-quartzo, portanto sob condições pelo menos de fácies xisto verde superior. Macroscopicamente, foram observados grãos milimétricos a centimétricos de rutilo em alguns xistos. O crescimento destes minerais ocorreu durante uma fase deformacional D1 e gerou uma xistosidade grosseira (S1). As granadas podem compor até 20 % em volume, e possuem diâmetros de até 8 mm. Acham-se rotacionadas, contendo foliação interna dada pelo arranjo de inclusões de quartzo e micas e são contornados pela foliação externa. Estão intensamente fraturadas e mostram-se alongadas. Nas fraturas crescem cloritas e micas brancas, bem como nas sombras de pressão (figura 5.39). As granadas mostram-se intensamente retrometamorfisadas para clorita, mica branca e minerais opacos (figura 5.40). Macroscopicamente, estas granadas compõem porfiroblastos ovalados que possuem coloração esverdeado-amarelada e, ao microscópio, observam-se restos de granadas em meio aos minerais retrometamórficos (figura 5.41). As micas brancas e biotitas acham-se em sua maioria deformadas, com extinção ondulante, ondulações e kinks. As biotitas reliquiares acham-se retrometamorfisadas para clorita. Sobre a foliação S1 cresceram porfiroblastos de cloritóide, presentes também no interior de alguns grãos de granada (figura 5.42). Os cloritóides são pós-tectônicos à fase D1, e pré-tectônicos à fase D2. A xistosidade S1 acha-se amplamente transposta por uma clivagem relacionada à fase deformacional D2. A formação desta clivagem deu-se sob condições retrometamórficas, com geração de clorita, mica branca e quartzo e desaparecimento da biotita, granada e cloritóide. Esta clivagem pode chegar a desenvolver bandas composicionais, com espessuras submilimétricas, ora mais ricas em clorita, ora em mica branca e mesmo em quartzo. Estas bandas definem uma foliação milonítica, uma vez que são marcadas por variações nos tamanhos dos grãos e desenvolvimento de superfícies S-C (figura 5.43). O quartzo arranja-se em fitas e em agregados alongados, sempre com extinção ondulante, desenvolvendo subgrãos e recristalizando para grãos menores. Seus contatos são irregulares e interpenetrados.

Os quartzitos possuem mica branca, além de quartzo. Mas podem conter também cloritóide, granada, clorita e minerais opacos. As granadas quase sempre estão retrometamorfisadas para um agregado de clorita, quartzo e minerais opacos (figuras 5.40 e 5.41). O quartzo forma agregados inequigranulares interlobados e localmente poligonais. Os cristais têm extinção ondulante, formam subgrãos e a recristalização por migração de bordos é comum. Nos quartzo-micaxistos, a foliação S3, definida pela orientação de micas brancas em grãos submilimétricos, é uma clivagem espaçada, com caráter milonítico, que transpõe parcialmente uma clivagem anterior (S2 ), também com caráter milonítico. Esta, por sua vez, foi superimposta a uma xistosidade grosseira (S1), marcada por grãos reliquiares de micas brancas (figura 5.44).

Os micaxistos feldspáticos representam metassedimentos intrudidos por granitos e pegmatitos, durante a fase deformacional D2 e estão intensamente milonitizados. Macroscopicamente, são identificadas bandas mais ricas em quartzo, em mica branca, em feldspatos, em fragmentos de granitos e pegmatitos, e mesmo bandas que ainda preservam granadas reliquiares do primeiro evento metamórfico. Xistos máficos ricos em porfiroclastos de feldspatos e granitos representam anfibolitos intrudidos por granitos e pegmatitos e a seguir milonitizados.

5.4.3. Rochas granitóides.

Em nenhum afloramento, as rochas granitóides mostram-se livres de deformação dúctil. Na medida em que a deformação aumenta, o que é comum nas margens dos corpos graníticos, passa-se de granitos foliados para granitos milonitizados que desenvolvem foliação milonítica com porfiroclastos imersos em matriz mais fina o que, às vezes, confere-lhes um aspecto gnáissico (figuras 5.45, 5.46 e 5.47). Quando o contato não é abrupto, a transição dos granitos para as encaixantes é marcada pelo gradual desaparecimento de feldspatos e aumento dos minerais das encaixantes (figura 5.48).

Deformações rúpteis, possivelmente ligadas aos estágios finais de D3, foram observadas em alguns afloramentos. Caracterizam-se pelo fraturamento dos minerais e desenvolvimento de feições cataclásticas (figura 5.49). Pseudotaquilitos são raros, mas podem desenvolver-se sobre foliações pré-existentes. Foi observada uma amostra de granito cataclástico que é cortada por fraturas preenchidas por pseudotaquilito de coloração rosada. Ao microscópio, as fraturas têm paredes retilíneas que seccionam os minerais. São preenchidas por matéria incolor, isótropa, onde estão imersos cristálitos e diminutos grãos de minerais opacos. Estes alteram-se para óxidos de ferro de coloração avermelhada. Fragmentos da rocha fraturada acham-se dispersos na massa. Nas paredes das fraturas, observa-se que os minerais estão corroidos. Veios de injeção também são comuns.

Os granitos podem ser divididos em dois tipos básicos: a) granitos médios a finos, localmente grosseiros, cinza escuros, cinza claros e cinza rosados, dominantemente porfíríticos, constituidos por feldspato potássico, plagioclásio, quartzo, biotita, com turmalina, anfibólio, titanita, granada e fluorita subordinados (denominados genericamente como granitos com biotita – capítulo 3); b) granitos médios a finos, cinza claros, às vezes porfiríticos, constituidos por feldspatos potássicos, plagioclásio, quartzo, biotita, mica branca, com turmalina e granada subordinadas e com fácies sienítico de pequena expressão (denominados genericamente como granitos a duas micas –capítulo 3) . Ambos foram descritos em conjunto, apenas destacando-se alguns aspectos relevantes ora para um tipo ora para outro. Ao primeiro grupo pertencem corpos graniticos que foram designados por Quebra Anzol e Pirapetinga. Ao segundo grupo pertencem os corpos graníticos Araxá, Serra Velha e Tamanduá (figura 5.50).

O quartzo mostra-se anédrico, intersticial, podendo ocorrer como inclusões em feldspatos e micas brancas. Seu diâmetro médio varia de 0,3 a 0,7 mm podendo alcançar os 3 mm. Quando incluso, é geralmente menor que 0,2 mm, podendo alcançar até 0,7 mm, com formatos arredondados e geralmente preservado da deformação. Forma agregados de fitas nos pontos de maior deformação. Os grãos maiores possuem extinção ondulante, desenvolvem subgrãos e passam lateralmente a agregados finos de grãos recristalizados, através do processo de migração de bordos de grãos (figura 5.51). A extinção ondulante no quartzo é um dos aspectos que mais se destaca nos granitos. De modo localizado, forma mosaicos policristalinos, cujos grãos são menores que 0,1 mm, com contatos retos, denunciando recristalização estática em zonas de menor deformação.

Os feldspatos potássicos são os mais abundantes e compreendem o ortoclásio e o microclínio, ora em proporções equivalentes, ora com microclínio subordinado em relação ao primeiro. Têm de 1 a 3 mm de diâmetro, mas podem desenvolver fenocristais com até 3 cm de diâmetro.

São anédricos a subédricos, com bordos irregulares e intercrescidos com os demais minerais. Alguns grãos são poiquilíticos, com inclusões de plagioclásio, mica branca, biotita e quartzo e mais raramente de titanita e granada (figura 5.52). Seus contatos são em geral interpenetrados com os demais minerais, podendo preservar algumas faces retas. Maclas segundo a lei de Carlsbad são raras. No entanto, maclas deformacionais polissintéticas, que se iniciam mais largas nos bordos e se acunham para o interior do cristal são comuns. Em uma amostra, observou-se que uma primeira deformação dos feldspatos gerou maclas deformacionais, que a seguir foram deslocadas por microfraturas que são por sua vez preenchidas por minerais metamórficos. Estes minerais acham-se também deformados o que evidencia uma história deformacional complexa. Nas fraturas intracristalinas ocorre neoformação de quartzo, feldspatos, mica branca e epidoto ( figura 5.45 e 5.53). A orientação das microfraturas geralmente é perpendicular e oblíqua à foliação milonítica. As microfraturas geram-se muitas vezes a partir dos planos de clivagem e mesmo deslocam estes planos. Ocorrem então rotações e deslocamentos de grãos por fraturas sintéticas (figura 5.54). Os feldspatos podem apresentar micropertitas distribuidas de modo regular em seu interior, possivelmente pré-deformacionais, pertitas em chama (figura 5.55 - flame perthites) e raras mirmequitas (figura 5.56). As pertitas em chama estão geralmente orientadas de modo oblíquo em relação ao plano de cisalhamento. As mirmequitas desenvolvem-se de modo oblíquo às faces dos cristais e em quadrantes opostos (quarter structures). Alguns cristais de ortoclásio transformam-se localmente para microclínio. Porfiroclastos manteados ocorrem com menor frequência. Formam grãos losangulares e arredondados circundados por agregados finos de feldspatos recristalizados, que podem prolongar-se ao longo da foliação (figura 5.47). Predominam os porfiroclastos manteados do tipo sigma. Com a finalidade de checar-se a composição destes agregados finos, procedeu-se a colorimetria de algumas seções delgadas que indicou que grande parte dos grãos mais finos das caudas dos porfiroclastos são de feldspatos potássicos.

Nos granitos menos deformados, alguns horizontes, paralelizados à foliação geral da rocha, apresentam cristais de feldspatos alinhados o que sugere fluxo magmático.

Os plagioclásios são anédricos a subédricos, com tamanho médio de 2 mm, podendo alcançar 3 mm, e ocorrem intercrescidos com os demais minerais ou como inclusões nos feldspatos potássicos. Neste caso são euédricos com tamanhos menores que 0,2 mm. Inclusões de quartzo são comuns em alguns grãos. Quase sempre estão intensamente saussuritizados. São comuns maclas polissintéticas segundo a Lei da Albita. Mostram extinção ondulante, microfraturas, kinks, desenvolvem subgrãos, recristalizam nos bordos e contêm maclas deformacionais (figura 5.57). Neoformação de plagioclásios ocorre junto aos agregados com quartzo, nas fraturas e nas áreas mais deformadas.

Em alguns corpos graníticos, ocorrem micas brancas juntamente com biotitas e compreendem cristais subédricos a euédricos com 2 a 3 mm de diâmetro, granulometria comparável à dos outros componentes ígneos (figura 5.58). Alguns cristais podem mostrar seções límpidas sem inclusões. Estas características indicam que estas micas brancas têm origem ígnea segundo os critérios texturais sugeridos por Miller et al. (1981). No entanto, embora ocorram como cristais isolados podem estar inclusas em ortoclásio, associadas à biotita, algumas vezes parecendo intercrescidas e outras formadas após a biotita, quando esta ocorre inclusa ou sobrecrescida pela mica branca. Isto sugere uma origem secundária (figura 5.59). As micas brancas mostram extinção ondulante, microkinks e arqueamentos suaves. Fraturas paralelas à clivagem (001) deslocam grãos, por deslizamento e rotação. Neste caso podem gerar aberturas que são preenchidas por minerais metamórficos. Uma segunda geração de micas brancas cresce às custas destas micas maiores. São palhetas menores que 0,1 mm formando agregados principalmente nos bordos das micas de primeira geração, estendendo-se ao longo da foliação e também gerando-se a partir dos plagioclásios e ortoclásios (figura 5.60)

As biotitas são subédricas a anédricas, com tamanhos variáveis entre 0,5 e 8 mm. As biotitas de origem ígnea apresentam forte pleocroismo, que pode ir do castanho claro ao castanho escuro e vermelho, em contraste com o fraco pleocroismo das palhetas menores de biotitas metamórficas. Uma feição interessante é a existência de intercrescimento entre biotita e ortoclásio. Este foi sendo invadido pela biotita e cresceu logo após em camadas a partir do grão original (figura 5.61). Esta textura poderia ter se desenvolvido quando o magma ainda estava em vias de cristalização e ao mesmo tempo era submetido à deformação. Notam-se pequenas diferenças de orientação cristalográfica entre o feldspato mais interno e os mais externos. Na continuidade do processo, os minerais foram deformados e a biotita se transformou parcialmente ou intercresceu com a mica branca. As biotitas podem ocorrer inclusas em granada e em feldspatos potássicos, e neste caso foi observado um cristal bordejado com micas brancas. Ocorrem no interior e bordos das micas brancas e como estas, mostram feições de deformação como extinção ondulante e dobramentos e apresentam cloritização parcial. Inclusões de zircões que geram halos pleocróicos são comuns. Também podem conter inclusões de apatita euédricas. Uma geração mais nova de biotitas forma-se às custas da anterior, compondo cristais menores que 0,1 mm e dispostos ao longo da foliação milonítica.

Como minerais acessórios foram observados granada, turmalina, apatita, titanita, anfibólio e zircão.

A granada ocorre como cristais euédricos e arredondados, com diâmetros entre 0,2 e 1,5 mm, fraturados, mais claros nos bordos. Foi observada uma granada, inclusa em feldspato potássico, com textura em atol, na qual o centro está preenchido por biotita (figura 5.62). Outras granadas têm seu núcleo substituido por fluorita, observando-se nitidamente sua corrosão (figura 5.63). Estas texturas sugerem a existência de um bordo mais resistente , e um núcleo mais suscetível à alteração química. Foram observadas granadas bordejadas por biotita e ambas inclusas em ortoclásio. Estas feições sugerem tratar-se de xenocristais herdados das rochas encaixantes.

As turmalinas, da variedade schorlita, aparecem como cristais prismáticos, menores que 2 mm, fraturados, com cores variáveis do cinza ao verde oliva.

O anfibólio aparece como grãos de até 3 mm, anédricos, com bordos sempre irregulares, com forte pleocroismo que vai do verde escuro ao verde azulado, o que indica tratar-se possivelmente de anfibólio sódico (Nockolds et al., 1978). Os cristais de anfibólio estão geralmente associados às micas, titanita , epidoto e minerais opacos e não ocorrem como inclusões nos feldspatos. Possuem extinção ondulante e são fraturados. Ocorrem em granitos que têm enclaves de anfibolitos o que sugere que os anfibólios sejam xenocristais.

A titanita ocorre como cristais menores que 3 mm, euédricos a subédricos, inclusos em feldspatos potássicos e biotitas, dispersa na rocha e associada às bandas mais micáceas, ou ainda como produto de transformação de minerais opacos (leucoxênio) quando pode estar arredondada e boudinada, com os espaços interboudins preenchidos por micas e epidotos.

Os epidotos formam agregados e grãos isolados com até 0,5 mm de diâmetro, mas são geralmente menores que 0,1 mm. Acham-se associados aos demais minerais metamórficos na foliação milonítica, e podem também formar-se a partir de plagioclásios.

A fluorita apresenta-se como agregados cristalinos incolores a violeta, que preenchem fraturas e penetram nas clivagens dos feldspatos, além de substituirem parcialmente algumas granadas (figura 5.62). Os cristais acham-se comumente associados a minerais opacos. Foi observado um grão cujas clivagens acham-se defletidas por deformação e cujos bordos mostram-se recristalizados para uma massa criptocristalina incolor de fluorita.

5.5. Comentários e Conclusões.

As condições do metamorfismo regional imposto às litologias estudadas foram resumidas na tabela 5.2. As diversas paragêneses ilustram o fato de que o esquema zonal do metamorfismo é do tipo Barroviano ( Yardley, 1994). O Grupo Ibiá é a unidade geológica de mais baixo metamorfismo, alcançando, no máximo, a zona da clorita do fácies xisto verde. As unidades Canastra e Araxá alcançaram pelo menos a zona da granada do fácies xisto verde, porém determinações da composição de anfibólios e plagioclásios demonstram que as rochas metamáficas alcançaram o fácies anfibolito. Como a unidade Ibiá está posicionada entre duas unidades com metamorfismo mais elevado, delas separada por zonas de cisalhamento, supõe-se que, durante o evento metamórfico M1, ela estava em posição crustal mais rasa, e portanto, espacialmente afastada daquelas, uma vez que não foram encontradas transições nas paragêneses metamórficas.

As litologias do Grupo Ibiá compreendem termos de granulação fina, com bandamento composicional milimétrico a centimétrico. Estas bandas são intercalações de siltitos e arenitos finos a muito finos com argilitos. Lembram laminações plano-paralelas de ritmitos. São metassedimentos clásticos ricos em quartzo, plagioclásio, clorita e com ortoclásio subordinado. Estes minerais registram a composição herdada da área fonte, já que foram detectadas bandas com grãos detríticos. Deste modo, parte do bandamento composicional pode estar refletindo o acamamento sedimentar original e que a área fonte era rica em rochas ígneas de composição intermediária a ácida. A presença de plagioclásio e ortoclásio nestes sedimentos restringe as condições de sua sedimentação. Segundo Tucker (1985) a maioria dos feldspatos em sedimentos é de primeira geração e sua presença é controlada pela taxa de erosão (que deve ser alta) e pelo clima (que deve ter intemperismo dominantemente físico).

No entanto, erosão rápida em uma área em soerguimento poderá produzir feldspatos, a despeito de um clima úmido. Mas um clima árido facilitará a presença de maior volume de felspatos frescos nos sedimentos. Os carbonatos também são abundantes nestas rochas, tanto que recebem a denominação de calcifilitos (Barbosa et al., 1970; Pereira, 1992), podendo-se atribuir sua origem tanto à processos diagenéticos quanto à reações metamórficas de quebra do plagioclásio e sua transformação para termos mais sódicos, sob a influência de um fluido rico em CO2. O principal efeito destas reações e da pressão dos fluidos foi a geração de veios de quartzo e carbonato paralelizados e mesmo discordantes da foliação S1.

As litologias do Grupo Araxá refletem o metamorfismo M1 na forma de granulometrias mais grosseiras, caracterizando xistos e quartzitos médios a grosseiros. Já as do Grupo Canastra mostram variação granulométrica de filitos a xistos a partir da Zona de Cisalhamento da Bocaina no sentido sul. Esta variação pode indicar mudança nas condições do metamorfismo que teria passado da zona da clorita para a zona da granada mais a sul. Os termos mais finos não foram estudados petrograficamente e esta variação zonal é sugerida apenas com base em critérios de campo. Algumas diferenças petrográficas podem ser constatadas entre as duas unidades. No Grupo Canastra é comum a preservação de grãos detríticos, como turmalinas e zircões, mesmo naquelas rochas mais deformadas, verificando-se também que petrograficamente os xistos contêm mais quartzo, além de ser comum a presença de matéria carbonosa. Segundo Miyashiro (1978) a grafita só se forma a partir do fácies anfibolito. No fácies xisto verde ela deveria ser reportada apenas como matéria carbonosa comparável ao antracito. Como o termo grafita tem sido amplamente empregado mesmo em fácies xisto verde, aquele autor dá continuidade ao seu uso, assumindo-se a mesma postura no presente trabalho. Quartzitos muito finos que lembram chert, intercalados com metapelitos são muito comuns no Grupo Canastra. Esta granulometria muito fina pode estar refletindo a granulometria dos sedimentos originais, mas pode também ser resultado de extrema cominuição e recristalização durante deformação, uma vez que estas litologias ocorrem ao longo da Zona de Cisalhamento da Bocaina. No entanto, em função do caráter heterogêneo da deformação D3 seria de se esperar a preservação de lentes com quartzitos mais grosseiros se estes existissem originalmente. Este fato não foi observado.

Nos xistos do Grupo Araxá, predominam termos mais pelíticos, onde são comuns paragêneses com mica branca, biotita e granada. Os termos quartzíticos são mais raros e quase sempre contêm granada. As rochas metamáficas associadas aos metassedimentos do Grupo Araxá alcançaram o fácies anfibolito, especialmente os anfibolitos ricos em granada, hornblenda e plagioclásio. A passagem do fácies xisto verde para o fácies anfibolito nas rochas metamáficas, dá-se quando do desaparecimento da albita e do surgimento do oligoclásio (Yardley, 1994), passando-se da zona da granada para a zona do oligoclásio. A zona do oligoclásio nos metabasitos corresponde à zona da estaurolita nos metapelitos. O forte retrometamorfismo imposto sobre as paragêneses M1 saussuritizou intensamente os plagioclásios, além de recristalizá-los parcialmente para albita.

O evento de retrometamorfismo RM1 que propiciou o crescimento de porfiroblastos de cloritóide fibro-radiados sobre as granadas (sintectônicas à D1) e porfiroblastos euédricos sobre a foliação S1, não foi acompanhado de deformação e afetou, aparentemente, apenas as unidades Canastra e Araxá. Estes aspectos texturais indicam que a geração de cloritóide deu-se sob condições retrometamórficas. O cloritóide é um mineral que cresce sob baixas temperaturas, compatíveis com o fácies xisto verde, às vezes presente na zona da granada e que tende a desaparecer no fácies anfibolito quando cede lugar à estaurolita ( Winkler, 1977; Miyashiro, 1978; Turner, 1981; Yardley , 1994). Sua ocorrência, no entanto, é restrita a rochas metapelíticas altamente aluminosas, em geral com altas razões Fe/Mg. Segundo Yardley (1994), em alguns casos, o cloritóide se aproxima do membro final rico em Mg (alta pressão - xistos azuis) da composição isomórfica, enquanto apenas cloritóide rico em ferro é encontrado em pressões médias e baixas. Como o cloritóide deve refletir a composição química das granadas, um estudo sobre a química mineral de granadas reliquiares poderá, no futuro, gerar conclusões a respeito das condições de pressão tanto de M1 como de RM1. A partir deste evento térmico, todas as litologias passaram a ser retrometamorfisadas sob condições do fácies xisto verde inferior, acompanhadas de deformação, e as paragêneses metamórficas tornam-se cada vez mais simples, o que sugere que as lâminas de empurrão foram atingindo posições crustais cada vez mais rasas.

No início de D2/RM2 houve a intrusão de magmas graníticos ao longo de zonas de cisalhamento de baixo ângulo no Grupo Araxá. Como a intrusão dos granitos ocorreu num momento precoce de D2 (capítulo 4), em alguns afloramentos preservados da deformação D2t foi possível identificar-se feições texturais ligadas à fluxo magmático, tais como bandas com feldspatos paralelizados às micas ígneas (Paterson et al, 1989), embora as texturas desenvolvidas no estado sólido estejam superpostas de modo expressivo. A presença de granitos ricos em mica branca e biotita, em contraste com granitos mais pobres em minerais micáceos, poderia determinar a existência de padrões distintos em sua deformação a exemplo dos granitos do Cinturão de Lachlan (Vernon e Flood, 1988). No presente estudo este contraste não foi observado, embora possa existir de modo mais sutil.

Com a progressão da deformação D2, as texturas desenvolvidas no estado sólido passaram a predominar, gerando-se uma paragênese com mica branca + clorita + albita + epidoto + quartzo, às custas dos minerais ígneos. Estas reações metamórficas podem ser referidas como sendo retrometamórficas (Pryer, 1993) e são encontradas em outros cinturões orogenéticos como nos Alpes Suiços (Fitz Gerald e Stünitz, 1993; Stünitz e Fitz Gerald, 1993), nas Cadeias Peninsulares da Califórnia ( Simpson, 1985) e no Cinturão Dobrado de Lachlan, Austrália (Vernon e Flood, 1988).

Com relação às condições termais a que os granitos foram submetidos durante a deformação D2, pode-se dizer que a saussuritização dos plagioclásios e a presença de pertitas em chama nos granitos de Araxá são feições comuns também a granitos submetidos a condições metamórficas do fácies xisto verde (Pryer, 1993: Pryer e Robin, 1995). Pryer e Robin (1995) elaboraram um modelo através do qual as pertitas em chama são formadas por substituição iônica nos feldspatos. Neste caso, íons de Na+ oriundos do plagioclásio iriam compor albitas nos ortoclásios e o K+ excedente destes iria para as muscovitas sobre o plagioclásio, conservando-se relativamente imóvel o Al. O Ca++ dos plagioclásios iria para os epidotos, o processo como um todo sendo induzido pela deformação. Um fato que se alia a este é a orientação preferencial das pertitas em chama, posicionadas obliquamente à foliação milonítica. Pryer e Robin (1995) realizaram estudo em uma amostra rica em pertitas e constataram que sua orientação corresponde à orientação da direção principal de tensões s 1 . Isto permite supor que sua gênese é similar à das fraturas de tensão. Um estudo neste sentido pode ser conduzido desde que haja um rigoroso controle na orientação das amostras e pode ser um interessante instrumento para se medir o paleostress atuante sobre a rocha.

Outro aspecto interessante nos granitos de Araxá e comum a outros granitos, é que as pertitas em chama localizam-se em certos grãos, enquanto outros ficam livres. Este fato pode ser explicado pela elevada resistência e baixa permeabilidade dos granitos, além da disponibilidade maior ou menor de água, de modo que as pressões de fluidos são diferentes em função da localização e orientação dos bordos de grãos. Além disso, a boa preservação da mineralogia nos granitos de Araxá indica que a extensão da hidratação dos diversos minerais foi baixa, pelo menos nos núcleos mais preservados dos granitos. O aumento na proporção de minerais micáceos no sentido das encaixantes poderia ter envolvido maior circulação de fluidos.

Pryer (1993) estudou granitos associados a uma lâmina de empurrão no Front de Grenville, Ontário, Canadá, estabelecendo, com base em dados microtectônicos dos feldspatos, comparados com dados experimentais de deformação de granitos, as sequências texturais típicas para cada grau metamórfico. No caso, o metamorfismo foi do tipo barroviano e as isógradas acham-se bem mapeadas. Comparando-se os dados da região de Araxá com os do Front de Grenville, verifica-se que as condições do metamorfismo nos granitóides de Araxá variaram do fácies xisto verde baixo a xisto verde superior, com intervalo de temperaturas de 300 a 450 oC. Além disso, o quartzo, por mostrar extinção ondulante, recuperação e recristalização por migração de bordos foi deformado sob condições de baixo a médio graus metamórficos (300 a 500 oC) (Passchier e Trouw, 1996). Em Araxá, os feldspatos acham-se parcialmente recristalizados nos bordos o que requer temperaturas acima de 450 oC (Paterson et al., 1989). Deste modo, pode-se supor que as temperaturas, durante a deformação dos granitos, oscilaram entre 300 e 500 oC.

Quanto aos mecanismos de deformação que operaram na região da Sinforma de Araxá, só é possível tecer-se comentários relativos às deformações D2 e D3. A gênese das clivagens de crenulação está ligada a processos de dissolução por pressão (dissolução de bordos de granadas, cloritas, micas brancas e biotitas, crescimento de novos minerais em sombras de pressão, presença de trilhas de minerais opacos nos domínos de clivagem) e recristalização por migração de bordos de grãos. A redistribuição de mica branca e clorita também é notável, a última concentrando-se nos micrólitons e a mica branca nos domínios de clivagem. Segundo Passchier e Trouw (1996), esta redistribuição se dá por um mecanismo de transferência por dissolução. Observa-se que estas clivagens, tipicamente associadas a dobras, passam a domínios de clivagens com caráter milonítico associadas a zonas de cisalhamento. Neste caso, a milonitização, por desenvolver tramas assimétricas, originou-se num contexto de deformação heterogênea não-coaxial, com cominuição de grãos e recristalização por migração de bordos de grãos. A deformação intracristalina, denunciada pela presença de abundantes extinções ondulantes, tanto no quartzo e nos feldspatos como nas micas, kinks nas micas e maclas deformacionais nos feldpatos, foi um processo importante nas condições de fácies xisto verde especialmente para os metapelitos. Nos granitos as feições mais comuns como extinção ondulante, maclas deformadas, maclas deformacionais e kinks indicam que os processos de deformação intracristalina também foram importantes. No entanto, tratando-se de agregados policristalinos, nos quais os minerais apresentam diferentes comportamentos reológicos (Passchier e Trouw, 1996), deve-se destacar o fato de que sob condições do fácies xisto verde, os minerais mais "moles" como quartzo, biotita e mica branca irão deformar-se por plasticidade cristalina (Lonka et al., 1998), enquanto os mais "duros", como os feldpastos, irão deformar-se ruptilmente através de fraturamentos. Isto indica que a deformação deu-se na transição dúctil-rúptil (Simpson, 1985). Com o aumento das taxas de deformação, ainda sob condições do fácies xisto verde, observados apenas localmente, passa a ocorrer fluxo granular na matriz mais dúctil, o tamanho dos feldpatos diminuindo por uma combinação de recristalização dinâmica e dissolução química (Lonka et al, 1998), ocorrendo rotação de corpo rígido e gerando-se os porfiroclastos manteados.

Todas as feições acima descritas mostram que o caminho PTt seguido pelas diversas unidades geológicas da Sinforma de Araxá é, aparentemente simples. As rochas foram primeiramente deformadas e metamorfisadas alcançando-se as condições de pressão (de 2 a 10 Kbar) e temperatura (até 500 a 600oC; Yardley, 1994) do fácies anfibolito (pico do metamorfismo M1). Seguiu-se evento térmico retrometamórfico RM1, sem deformação associada, e a partir daí o gradual arrefecimento das condições de pressão e temperatura quando deformação e metamorfismo atuaram em conjunto (D2/RM2 e D3/RM3) nas condições típicas do fácies xisto verde.

 

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